O Retorno do Trump Trade e Seus Reflexos no Brasil
A Reedição do "Trump Trade" em 2024: O Que Esperar?
Em 2024, os investidores do mercado global deram um novo impulso ao famoso “Trump Trade”, uma estratégia que busca se antecipar às consequências de uma possível reeleição de Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos. Se você não está familiarizado com esse termo, o “Trump Trade” envolve decisões financeiras que refletem as expectativas dos investidores em relação à presidência de Trump. Este fenômeno é moldado por sua trajetória política, as promessas feitas durante a campanha e as possíveis consequências de políticas conservadoras que impactam, em especial, o comércio exterior e a política fiscal americana.
Diante do histórico de Trump e das especulações sobre a possibilidade de que ele retome sua postura rigorosa em relação às tarifas de importação, os mercados começaram a reagir. O dólar se fortaleceu, enquanto as expectativas quanto a uma queda moderada nas taxas de juros nos EUA ganharam força. No entanto, os impactos iniciais desse novo “Trump Trade” no Brasil foram bastante peculiares, mostrando um quadro doméstico repleto de incertezas fiscais e monetárias.
A Corrida Eleitoral e Suas Oscilações
Com a proximidade das eleições norte-americanas, o mercado estava em constante monitoramento das mudanças nas chances de vitória de Trump. A corrida democrática passou por reviravoltas, com a desistência de Joe Biden e a escolha de Kamala Harris como nova candidata. As probabilidades oscilavam: em certos momentos, Trump liderava, enquanto, em outros, Harris recuperava a dianteira. Para tumultuar ainda mais a situação, Trump sofreu um atentado, mas sua rápida recuperação injetou ânimo em sua campanha.
Essas flutuações geraram uma significativa volatilidade na curva de juros dos EUA e no índice DXY, que avalia a força do dólar em relação a outras moedas importantes. Cada mudança na corrida eleitoral parecia pressionar os mercados globais, principalmente nos países emergentes. À medida que cresciam as expectativas em torno de um possível governo Trump, os investidores adotaram uma postura de “risk-off”, priorizando ativos mais seguros, como o dólar americano, em detrimento de ativos de mercados emergentes.
O Impacto Imediato Após a Vitória de Trump
Quando a vitória de Trump foi oficialmente confirmada, as reações não demoraram a surgir. No dia seguinte à apuração dos votos, o dólar viu uma alta em relação a diversas moedas ao redor do mundo, enquanto as taxas de juros nos EUA também se elevaram. O mercado acionário americano reagiu de forma otimista, com um aumento robusto nos índices, refletindo a expectativa de que uma política econômica sob sua liderança privilegiaria cortes de impostos e expansão dos gastos públicos.
E o Brasil?
Diferentemente do esperado, o cenário brasileiro desenvolveu-se de forma contrária. Em vez de ver o real se depreciar, observou-se uma leve valorização da moeda brasileira, enquanto a curva de juros local se manteve estável. Esse comportamento destaca o contexto fiscal brasileiro: enquanto o mundo lidava com o fortalecimento da economia americana e crescente incertezas, o Brasil começava a ajustar suas expectativas em relação às medidas de corte de gastos sinalizadas pela equipe econômica do governo Lula.
A resistência inicial do real e a estabilidade dos juros, mesmo após a vitória de Trump, sugerem que o cenário fiscal no Brasil desempenha um papel crucial no comportamento dos ativos locais. A expectativa de um ajuste fiscal e a implementação de cortes estruturais têm contribuído para uma maior capacidade de recuperação do mercado doméstico. No entanto, é preciso ter cautela. A deterioração fiscal continua a representar um elevado risco, especialmente se o governo não conseguir implementar as reformas necessárias e atender às expectativas formadas.
Desafios e Expectativas: O Que Vem pela Frente
O Brasil enfrenta desafios significativos ao longo de 2024. A moeda já apresenta uma considerável depreciação, posicionando-se como a moeda emergente que mais perdeu valor no ano. Se as reformas não forem concretizadas, existe o risco de emergir uma nova onda de incertezas, impactando diretamente a inflação e o crescimento econômico.
A expectativa do retorno de políticas protecionistas, com Trump em uma posição de força no Senado e na Câmara, complicará ainda mais o panorama para economias emergentes como o Brasil. Espera-se que haja um aumento nas tarifas sobre produtos chineses e sanções sobre países que não estejam sob a influência americana. Esse movimento deve fortalecer ainda mais o dólar e elevar o custo das importações, resultando na redução do preço e volume de commodities exportadas, onde tanto a China quanto os EUA são peças-chave.
Além disso, o endurecimento das políticas migratórias prometido por Trump pode ter impactos diretos sobre a inflação nos EUA. A redução na força de trabalho imigrante pode gerar custos mais elevados nos serviços, resultando em pressões inflacionárias que podem reverberar também no Brasil, afectando áreas que dependem da importação de insumos e produtos dos EUA e de mercados próximos.
A Necessidade de Ajustes Fiscais
O futuro econômico do Brasil dependerá da capacidade do governo de implementar um ajuste fiscal realista e sustentável. Embora tenha mostrado sinais de resistência ao “Trump Trade”, a curto prazo a margem de segurança é estreita se as reformas estruturais não forem entregues a tempo. O risco fiscal, neste momento crucial, pode acentuar-se em um cenário de dólar forte, inflação global em alta e juros americanos elevados, o que pode pressionar ainda mais a curva de juros e o câmbio no Brasil.
Disso tudo, é evidente que o governo local precisará adotar uma postura firme para enfrentar os problemas fiscais e ajustar a estrutura das despesas obrigatórias, que aumentam em ritmo mais acelerado do que a arrecadação e a inflação.
Reflexão Final
O ponto de inflexão econômico do Brasil demanda ações proativas e efetivas. Para estabilizar a moeda e reduzir a volatilidade dos ativos, será necessário não apenas anunciar, mas também cumprir as promessas de corte de gastos. O “Trump Trade” trouxe novos desafios, mas também reforçou a urgência para que o Brasil ajuste suas contas públicas. Este ajuste não é essencial apenas para enfrentar os impactos diretos das políticas de Trump, mas também para solidificar a posição do Brasil em um mundo cada vez mais incerto e impregnado de protecionismo.
Em tempos de transformação, será vital que o Brasil se prepare para as incertezas vindouras, buscando não apenas recuperar a estabilidade econômica, mas também melhorar as condições de vida de sua população. O momento demanda diálogo, comprometimento e uma visão clara para o futuro econômico do país.
Luiz Fernando Figueiredo é presidente do Conselho de Administração da JiveMauá. Este artigo conta com a co-autoria de Italo Faviano, economista da Buysidebrasil.