
Matéria traduzida e adaptada do inglês, publicada pela matriz americana do Epoch Times.
NOVA DÉLHI – Recentemente, a mídia estatal da China lançou críticas ao Ministro das Relações Exteriores da Índia, Subrahmanyam Jaishankar, usando o termo “problema” para descrever sua influência nas relações entre os dois países. Essa reação surgiu após os comentários diretos de Jaishankar sobre as tensões com Pequim.
Com a cúpula do BRICS se aproximando em Kazan, marcada para 22 de outubro, especialistas apontam que a crítica pode refletir tanto uma defesa em resposta à postura direta de Jaishankar quanto uma tentativa da China de moldar uma “narrativa estratégica” que promova seus próprios interesses. O BRICS, que originalmente incluía Brasil, Rússia, Índia e China, se expandiu em 2010 com a adição da África do Sul e, mais recentemente, convidou outros países como Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã e Arábia Saudita. A relação cada vez mais tensa entre Índia e China, especialmente em questões de fronteira, deve ser um tema central nesta cúpula.
A situação atual não apenas destaca a geopolítica complicada entre Índia e China, mas também o papel de Jaishankar como um importante interlocutor neste diálogo. Ao personalizar a crítica, analistas sugerem que a China pode estar tentando fazer outros funcionários indianos parecerem mais dispostos à negociação.
O “problema S. Jaishankar”
No dia 9 de setembro, o Tempos Globais, publicação estatal chinesa, se referiu nominalmente a Jaishankar em um editorial intitulado “A diplomacia da Índia tem um ‘problema S. Jaishankar’”. Ele vinha, nas últimas semanas, expressando suas preocupações sobre a relação adversarial com a China. A crítica se intensificou, com o A Impressão, um veículo indiano, chamando a resposta do Tempos Globais de “bate e corre”, já que o artigo foi rapidamente retirado do ar, mas ainda estava disponível na versão chinesa.
Não era a primeira vez que Jaishankar era mencionado por essa mídia; o diplomata, que atuou como embaixador da Índia na China entre 2009 e 2013, voltou ao cargo de ministro das Relações Exteriores após a reeleição do primeiro-ministro Narendra Modi em junho. Após sua nomeação, o Tempos Globais publicou um artigo prevendo que, sob sua liderança, “nenhuma mudança significativa na política de relacionamento da Índia com a China era esperada”, retratando-o como um impedimento ao fortalecimento dos laços bilaterais.
Uma narrativa estratégica
Para Satyendra Pradhan, ex-vice-conselheiro de segurança nacional da Índia, as críticas dirigidas a Jaishankar pela mídia estatal chinesa são parte de uma “narrativa estratégica” da China, que visa defender seus interesses nas relações com a Índia. Essa narrativa também pode ser uma tentativa de garantir apoio da Índia em fóruns multilaterais, onde a China enxerga o país como um rival.
Ele destaca que as dificuldades econômicas da China aumentam a necessidade de manter laços comerciais estreitos com a Índia, que, em 2023, teve um comércio bilateral de quase US$ 114 bilhões com o país asiático. Projeções do Banco Mundial indicam um crescimento de 7% para a Índia em 2024–25, enquanto a taxa de crescimento esperada para a China é de apenas 4,7%. Pradhan afirma que a China busca entender sua posição em um cenário regional diversificado, enquanto a Índia ganha cada vez mais relevância em questões globais, enfrentando seus próprios desafios econômicos.
“As críticas do Tempos Globais a Jaishankar não são apenas pessoais, mas definem uma estratégia mais ampla — culpá-lo enquanto tentam colocar outros oficiais em um papel mais conciliador”, observa Pradhan, para quem essa narrativa visa mitigar a assertividade que o ministro indiano tem demonstrado ao expressar as preocupações do seu país.

Reafirmando as preocupações nas fronteiras
A tensão nas relações entre Índia e China permanece palpável. O violento confronto de Galwan em 2020, que resultou na morte de 20 soldados indianos e um número desconhecido de soldados chineses, foi um desdobramento sério em um relacionamento já conturbado. Nesse cenário, Jaishankar tem reiterado a importância de estabelecer relações bilaterais estáveis, segundo análises de especialistas.
Em uma palestra em homenagem a Sardar Patel, no dia 5 de outubro, ele sublinhou: “Para que possamos avançar, é necessário restaurar a paz e a tranquilidade nas áreas fronteiriças, respeitando a Linha de Controle Real (LAC) e evitando mudanças no status quo. Além disso, os três mútuos — respeito, sensibilidade e interesses — constituem um caminho viável. Afinal, a ascensão da Ásia depende de uma dinâmica positiva entre Índia e China.”
Jaishankar também comentou em uma reunião em Genebra, no dia 12 de setembro, que 75% das questões de desengajamento em Ladakh estão resolvidas, mas os 25% restantes são os mais desafiadores. Ele reforçou que a Índia enfrenta um “problema especial com a China” em um contexto global cada vez mais preocupado com o comportamento da potência asiática.
A resposta do Tempos Globais às suas declarações sugere que as tensões estão se intensificando. O artigo apontou que Jaishankar, em sua posição, parece não priorizar os interesses nacionais e que a busca pela melhoria das relações com a China pode ter gerado desconforto em seu papel.
Comparações históricas
O editorial do Tempos Globais também comparou Jaishankar a figuras proeminentes da história da Índia, como Jawaharlal Nehru e Indira Gandhi. A publicação argumentou que Jaishankar não possui o “senso moral” de Nehru, cujo terceiro mandato foi marcado pela guerra Índia-China de 1962, um evento que moldou profundamente a dinâmica de fronteira entre os dois países.
Além disso, o artigo insinuou que o ministro carece do “senso ético” de Gandhi, refletindo a crítica mais ampla às suas abordagens diplomáticas. O Congresso Nacional Indiano, liderado antes por Nehru e Gandhi, atualmente é a principal força de oposição no Parlamento indiano.
A diplomacia de Jaishankar, segundo o Tempos Globais, é frequentemente ambígua e suas declarações sobre a China são consideradas enganosas na opinião pública internacional. A percepção de que a Índia não representa uma ameaça à China, mas sim o contrário, é reforçada por especialistas que alertam para as intenções da potência asiática.
A tensão em foco
Apesar de buscar um “caminho a seguir”, Jaishankar não hesita em ser crítico em relação à posição da China, especialmente em fóruns públicos. A abordagem entre os membros do governo indiano parece conflituosa, refletindo a complexidade da diplomacia em questão. Há aqueles que defendem uma aproximação cautelosa com a China, enquanto outros advogam por um maior aprofundamento em iniciativas econômicas com o país.
Espera-se que a cúpula do BRICS sirva como um importante ponto de inflexão para as relações Índia-China, com a China desejando apresentar uma imagem de cooperação pacífica, mesmo que as afirmações críticas de Jaishankar coloquem essa imagem em risco. Campanhas anteriores de reaproximação nem sempre foram acompanhadas por progressos tangíveis na resolução de conflitos fronteiriços, o que gera aversão a uma reconciliação apressada entre os dois países.
Jaishankar destaca que a história revela uma relação marcada pela desconfiança e conflito, e avisa que a China ainda mantém objetivos que podem minar a segurança indiana. Ele lembra a importância de reconhecer que as tensões nas fronteiras não são apenas questões diplomáticas, mas refletem uma agenda de longa data do regime chinês.
Esse cenário demanda uma reflexão sobre como a Índia irá moldar sua estratégia de enfrentamento com a China, garantindo sua segurança e interesses regionais. A forma como a Índia navega por estas complexas relações pode muito bem determinar o futuro de sua posição global.
Os desdobramentos desse embate diplomático não apenas afetam a região asiática, mas têm implicações em toda a ordem internacional. Afinal, o mundo observa como duas potências nucleares lidam com suas divergências e como isso pode impactar o futuro da diplomacia mundial.