A Nova Era Diplomática de Donald Trump: Ideologia em Primeiro Lugar
Nos últimos dez meses desde o retorno de Donald Trump à presidência dos EUA, o panorama das relações internacionais tem sido profundamente alterado. Trump não apenas reconfigurou a arquitetura física da Casa Branca, mas também desafiou as percepções tradicionais da política externa americana, criando um novo molde de interação com aliados e adversários.
A Ideologia Sobressaindo-se à Economia
Inicialmente, as tarifas e a retórica protecionista de Trump criaram a impressão de que ele se importava mais com questões comerciais do que com as dinâmicas políticas de outros países. No entanto, os acontecimentos recentes revelam uma abordagem ideológica mais complexa. A hostilidade do presidente em relação ao Brasil, sob Luiz Inácio Lula da Silva, contrasta com o apoio financeiro incondicional a Javier Milei, presidente populista da Argentina. Esse fenômeno demonstra que Trump se guia por uma divisão ideológica entre esquerda e direita, afastando-se da antiga dicotomia entre democracia e autoritarismo. Enquanto lideranças passadas se preocuparam em difundir a democracia, Trump parece mais interessado em promover sua agenda política interna, que é fortemente anti-imigração e contrária a ideais considerados “woke”.
Europa: A Aliança com a Extrema Direita
Um dos aspectos mais notáveis da nova orientação de Trump é sua relação com a extrema direita na Europa. Seu desprezo pela União Europeia e as tradições liberais que sustentam a aliança transatlântica o levaram a se alinhar com partidos de direita como a Liga da Itália, o AfD na Alemanha, e Vox na Espanha. Esse apoio reflete uma crença de que muitos países europeus estão à beira de uma virada política semelhante àquela observada nos EUA.
O Surgimento dos “Patriotas da Europa”
A ideia de que as forças políticas de direita na Europa estão colaborando ganhou força. Um novo grupo, os “Patriotas da Europa”, emergiu com o slogan “Fazer a Europa Grande Novamente”, ecoando a estratégia MAGA. Essa colaboração sugere uma expectativa de que países europeus estão caminhando em direção a um realinhamento político similar ao dos EUA.
A Estratégia Geopolítica e os Riscos Envolvidos
Apostar na extrema direita europeia é uma manobra que, à primeira vista, parece vantajosa para Trump. Com essa abordagem, os EUA podem manter uma certa influência enquanto reduzem seu compromisso militar na Europa, algo que Trump já começou a questionar. Porém, esse jogo tem suas armadilhas. O risco de polarização política pode resultar em uma Europa fragmentada, onde até mesmo os líderes de direita não necessariamente alistam-se ao lado de Trump em questões como China ou Rússia.
O Papel dos Políticos Iliberais da Europa Central
Um exemplo disso é Viktor Orban, primeiro-ministro da Hungria, frequentemente elogiado por Trump. A relação começou a se solidificar com a isenção da Hungria de sanções relacionadas à importação de petróleo russo. Polônia, Slovênia e República Tcheca também têm líderes que flertam com a ideologia MAGA, mas o alinhamento geopolítico ainda é incerto.
Uma Transformação Ideológica na Europa
A transição da “ocidentalização” para a “orientalização” se torna cada vez mais visível. O crescimento do AfD na Alemanha, considerado uma ameaça extremista, exemplifica essa mudança. Há uma crescente semelhança entre as atitudes no oeste europeu e as que prevaleceram durante a crise migratória de 2015 no leste da Europa. Essa mudança ideológica aproxima a Europa do pensamento político de Trump.
Polarização da Percepção Americana
Uma pesquisa recente indicou que a imagem dos EUA na Europa agora é amplamente moldada pela percepção sobre Trump. Entre os apoiadores dos partidos de direita, há uma visão positiva da política americana, enquanto os eleitores de centros políticos tendem a ter uma visão negativa. Essa polarização revela que a relação entre a Europa e os EUA não é mais apenas uma questão de afinidade, mas uma disputa entre campos políticos pro e anti-Trump.
O Futuro das Relações Europeias sob a Sombra de Orban
A influência de Orban é indiscutível. Se ele conseguir se reeleger em 2026, poderá definir os rumos da estratégia geopolítica pós-liberal da Europa. Contudo, suas visões sobre a “autonomia estratégica” da Europa e a sua recusa em se aliar rigidamente à política dos EUA trazem à tona a questão: será que a Rússia fará parte desse novo império iliberal? Observadores apontam que a divisão sobre a questão da Rússia pode desarticular ainda mais a união entre os novos líderes de direita.
Os Desafios da Ascensão da Direita Populista
Embora a intenção de Trump seja desmantelar a hierarquia liberal da UE, a ascensão da direita populista pode não garantir uma influência americana renovada. Erros estratégicos estão presentes na suposição de que a aceitação de líderes favoráveis a Trump resultará em uma aliança sólida.
O Efeito do “Scramble for Europe”
O que pode ocorrer é um cenário de “competições por influência”, onde potências como China e Rússia e países do Oriente Médio disputam espaço em um continente em crise econômica e política. Este ambiente será muito diferente daquele que os EUA conheciam, e haverá um despertar para a necessidade de uma Europa capaz de se defender sozinha em um mundo hostil.
O Impacto de Trump e a Volatilidade da Nova Europa
As políticas de Trump, ao alienar o establishment liberal, podem criar uma nova geração de líderes que não veem a parceria com os EUA como uma prioridade. Essa linguagem de aproximação à direita pode não se sustentar quando líderes populistas enfrentarem pressão de seus próprios eleitorados.
A Necessidade de Um Novo Discurso
Por último, a questão do “nacionalismo civilizacional” que domina o discurso conservador americano pode criar tensões entre a visão de muitos europeus sobre a identidade. Com a crescente eficácia da direita tradicional, surge a antiga questão alemã sobre o equilíbrio de poder dentro da Europa, levantando receios entre países vizinhos.
O Futuro da Relação Europa-EUA
Se a estratégia de Trump for impor uma maior aliança ideológica enquanto reduz o suporte econômico e militar, as chances de sucesso são limitadas. Os partidos da direita europeia, assim como seus pares centristas, compreenderão rapidamente que a cada vez mais confusa paisagem geopolítica levará à necessidade de autonomia.
Neste novo contexto, a questão permanece: como a Europa, agora mais dividida que nunca, irá se alinhar com os interesses dos EUA? As escolhas que estão sendo feitas agora podem moldar as relações internacionais nas próximas décadas.
Essa reconfiguração do panorama político está longe de ser uma história concluída, e as implicações ainda estão se desenrolando. A todos nós cabe observar atentamente os novos desenvolvimentos e tirar nossas próprias conclusões sobre o futuro da Europa e dos Estados Unidos em um mundo em constante mudança.
