Desde a aprovação do arcabouço fiscal, no início do terceiro trimestre, o tema fiscal havia ficado relativamente calmo, com os esforços do Ministério da Fazenda focados em implementar medidas de arrecadação capazes de equilibrar as contas públicas.
Porém, a tranquilidade durou até o recente discurso do presidente Lula, sugerindo que a meta fiscal de 2024 – inicialmente estabelecida em 0% – não precisava ser cumprida e dificilmente seria alcançada. Logo após, o ministro Fernando Haddad tentou conter os danos, mas não confirmou a manutenção da meta, aumentando o clima de incerteza.
Atualmente, a discussão gira em torno de uma alteração da meta fiscal para um déficit de até -0,5% do PIB. No entanto, o mercado financeiro já precifica um cenário pior, com projeções de -0,8% em média, considerando:
- Subestimativa das despesas obrigatórias.
- Expectativas superestimadas de arrecadação extra.
Impactos no Mercado: Memórias de 2015
O desconforto do mercado tem raízes históricas. O último episódio de revisão da meta fiscal, em julho de 2015, serve como exemplo. Na ocasião, o governo reduziu a meta de 1,1% para 0,2% do PIB, causando uma reação imediata nos principais indicadores:
- Juros futuros (pré de 5 anos): abriram mais de 300 pontos-base.
- Câmbio: desvalorização de cerca de 20%.
- Bolsa de Valores: queda próxima a 10%.
Além disso, as expectativas de inflação também foram afetadas. A pesquisa Focus mostrou aumento de 22 pontos-base na inflação esperada para 2015 e 46 pontos-base para 2016.
No contexto atual, as preocupações são ainda maiores:
- O horizonte relevante do Banco Central (BC) está entre 2024 e 2025.
- O cenário externo desafiador para economias emergentes pressiona ainda mais as decisões monetárias.
Preocupações Políticas e Credibilidade
Do lado político, a redução da meta fiscal pode enfraquecer o engajamento do Congresso na aprovação de medidas para aumentar a arrecadação. A percepção é de que atingir o novo objetivo será menos desafiador, o que pode comprometer o esforço de consolidação fiscal.
Além disso, a credibilidade do Ministério da Fazenda está em risco. Em menos de três meses após a aprovação do arcabouço fiscal, a facilidade em alterar a meta por meio de uma emenda na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) gera preocupações sobre o compromisso real com o equilíbrio das contas públicas.
Impacto nas Decisões do Banco Central
O BC tem reiterado sua preocupação com a trajetória fiscal nos comunicados e atas do Copom. A meta fiscal desempenha um papel crucial na percepção de risco e nas projeções futuras. Um cenário fiscal mais deteriorado:
- Complica o esforço do BC para reduzir os juros básicos (Selic).
- Eleva as expectativas de inflação, dificultando o cumprimento das metas inflacionárias.
Com o ambiente externo ainda incerto, marcado por juros elevados em economias desenvolvidas, as dúvidas sobre a sustentabilidade fiscal do Brasil agravam a situação e podem limitar ainda mais a margem de manobra do Banco Central.
Conclusão: O Que Esperar?
A discussão sobre a revisão da meta fiscal de 2024 gerou um cenário de volatilidade e incerteza que afeta o mercado, o Banco Central e as perspectivas econômicas do país. Para evitar um impacto semelhante ao de 2015, é essencial que o governo reforce seu compromisso com a consolidação fiscal e adote medidas críveis para manter o equilíbrio das contas públicas.
Caso contrário, a confiança do mercado, as expectativas de inflação e a capacidade de reduzir os juros podem ser severamente comprometidas, criando um cenário ainda mais desafiador para a economia brasileira.