A Crise Ucraniana e o Desafio da Aliança Ocidental
O preocupante encontro entre o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky e o presidente dos EUA, Donald Trump, junto ao vice-presidente JD Vance, na Casa Branca no dia 28 de fevereiro, trouxe um momento de reflexão profunda para a Aliança Ocidental. O que parecia ser uma discussão de apoio à Ucrânia rapidamente se transformou em uma crise de confiança. As ações do governo Trump não apenas abalaram as expectativas ucranianas, mas também levantaram questionamentos sobre os fundamentos do relacionamento transatlântico que perduram desde a Segunda Guerra Mundial.
O Medo nas Capitais Europeias
As reações nas capitais europeias foram de pânico. A ideia de que a OTAN poderia estar chegando ao fim ou que o Ocidente poderia se desintegrar começou a ganhar força. Muitos líderes e analistas se perguntavam se Washington realmente pretendia minar a existência soberana da Ucrânia. A especulação de que Trump poderia estar tentando negociar com o líder russo Vladimir Putin, sugerindo uma aliança desfavorável com a Rússia, aumentou as tensões. Esse cisma na confiança transatlântica tem repercussões significativas para a imagem global de potência hegemônica dos EUA e a coesão da OTAN.
Uma Aliança Sob Pressão: O Que Fazer?
Ainda que o desafio atual seja assustador, a aliança já enfrentou crises antes. Há argumentos consistentes, tanto na América quanto na Europa, que sugerem que, com esforço, a aliança pode se recuperar e manter a presença dos EUA na Europa. É importante que os países europeus demonstrem que sua colaboração é vital para a força americana e que este laço é mútuo.
Reflexões Sobre o Erro de Minsk
Nos anos 90, algumas vozes já defendiam o desmantelamento gradual da OTAN após o fim do Pacto de Varsóvia. Contudo, desde que a Rússia enveredou por um caminho revisionista nos últimos anos, especialmente após a anexação da Crimeia e a invasão do Donbas em 2014, a OTAN não só sobreviveu, mas também se fortaleceu. A unidade, a cooperação e a capacidade de dissuasão da aliança cresceram.
A administração Trump introduziu um novo dilema: pela primeira vez, líderes europeus ficaram incertos quanto ao comprometimento dos EUA com a OTAN. Entretanto, é crucial lembrar que, durante o primeiro mandato de Trump, os EUA desempenharam um papel determinante na defesa da Ucrânia, fornecendo apoio militar essencial que possibilitou à Ucrânia resistir à invasão russa em 2022. O envio de armamentos como os mísseis antitanque Javelin foi vital para a resistência ucraniana.
Perigos de Deixar a Europa Sozinha
Os Estados Unidos estão cientes dos riscos envolvidos em deixar a Europa lidar sozinha com a Rússia. Após a anexação da Crimeia em 2014, Washington decidiu delegar a responsabilidade da confrontação com Moscou aos europeus, o que gerou desafios adicionais. Os processos de Minsk e Normandia, envolvendo negociações entre França, Alemanha, Rússia e Ucrânia, falharam em garantir paz duradoura.
Esses eventos ecoam a situação de três décadas atrás, quando a guerra na Bósnia levou à ideia da "hora da Europa", que na prática não avançou. Somente com a intervenção dos EUA, essa guerra foi finalmente resolvida pelos acordos de Dayton de 1995.
A Lição das Guerras Passadas
A administração de Trump, assim como a de Biden, parece ter aprendido com os erros anteriores. Nenhuma delas se deixou levar pela falha da Casa Branca de Obama, em 2014, que não conseguiu guiar uma solução para a crise ucraniana. Ao contrário, decidiu tomar a frente em um esforço internacional robusto para apoiar a Ucrânia após anos de conflito.
Os EUA precisam urgentemente do envolvimento estratégico europeu para evitar uma perda de foco em sua política externa. É vital que os dois lados do Atlântico restabeleçam rapidamente a confiança. Para que isso aconteça, a Ucrânia deve ser incluída ativamente nas negociações de paz – o sucesso depende de um acordo que seja justo e que considere suas necessidades.
O Papel da Europa e da Segurança Coletiva
A tensão crescente entre Washington e Kiev também revela a necessidade de um novo olhar sobre a segurança europeia. Embora a presença militar americana na Europa tenha sido reforçada recentemente, ela ainda é pequena se comparada ao efetivo russo. A exclusão de tropas americanas em solo ucraniano significa que os EUA dependem de seus aliados europeus, que devem ser firmes em sua posição nas negociações de paz.
Os europeus, por sua vez, têm a responsabilidade de deixar claro que não haverá ação militar sem sua participação nas discussões. O entendimento mútuo deve ser que um acordo pacífico vai além de um mero cessar-fogo; deve estabelecer uma paz duradoura para toda a Europa.
Um Chamado à Ação
A maior necessidade agora é de liderança efetiva na Europa. Os países europeus, como França, Alemanha e Polônia, devem unir forças e demonstrar sua capacidade de contribuir significativamente para a segurança coletiva. Um modelo de defesa europeu (EDU) poderia ser uma solução, promovendo uma resposta unida e decisiva às ameaças existentes.
A ideia é que esses países formem um grupo central que converse com uma voz coesa sobre questões de segurança e defesa. Isso inclui o desenvolvimento de um mercado de defesa europeu unificado e preparação conjunta de suas forças armadas.
Uma Nova Abordagem para a Paz
Restabelecer um formato de grupo de contato, já testado em negociações anteriores, poderia ser uma maneira eficaz de unir esforços. Os EUA devem liderar essa iniciativa, apoiando uma solução colaborativa que envolva a Europa e a Ucrânia. Essa abordagem pode fornecer a estrutura necessária para garantir que a guerra chegue ao fim.
Reflexões Finais
Trinta anos atrás, Richard Holbrooke, em um ensaio na revista Foreign Affairs, destacou a necessidade constante de um envolvimento ativo dos EUA na Europa. O cenário atual confirma que a demanda por uma liderança americana e pela colaboração europeia é mais relevante do que nunca. Para encerrar a guerra na Ucrânia e restaurar a paz duradoura, ambos os lados devem trabalhar juntos, reconhecendo que suas forças combinadas são essenciais para o equilíbrio e a segurança da região.
Vamos torcer para que, em tempos difíceis, a Casa Branca perceba a importância dessa realidade e atue de acordo. O futuro da Ucrânia e da Aliança Ocidental depende mais do que nunca da nossa capacidade de diálogo e ação conjunta.