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Em 2024, os preços do cacau na Bolsa de Nova York atingiram patamares impressionantes, marcando várias máximas históricas ao longo do ano. Logo no começo de janeiro, a amêndoa já deu sinais do seu valor, apresentando uma alta de 1,51% no dia 23, alcançando US$ 4.634 a tonelada, um recorde para o mês. A tendência de aumento continuou em fevereiro, com os contratos subindo para US$ 5.074 por tonelada. Porém, o que aconteceu em março e dezembro desse ano foi ainda mais surpreendente: os contratos chegaram a níveis históricos, atingindo US$ 10.080 e, em dezembro, fecharam a US$ 12.565, com picos que chegaram a US$ 13 mil ao longo do dia.
O cenário de escassez global de amêndoas de cacau está em destaque, com um déficit estimado em 500 mil toneladas. Para entender melhor o que está acontecendo e quais os impactos disso, conversamos com Anna Paula Losi, presidente-executiva da Associação das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC). A associação representa as maiores moageiras do Brasil, incluindo a Cargill, Barry Callebaut, OFI e IBC, que juntas respondem por 95% da moagem de cacau nacional.

Cacau alcançando máximas históricas consecutivas.
O que provocou o recente aumento nos preços?
Inicialmente, havia a expectativa de que os preços do cacau se estabilizassem em um nível mais baixo, mas dezembro trouxe uma reviravolta surpreendente. O mercado começou a perceber que a oferta que se esperava para o próximo ciclo não seria tão generosa assim. As indústrias, reconhecendo esta necessidade urgente de cacau, começaram a se preparar para um possível déficit maior do que o inicialmente previsto.
Este final de ano não é o momento típico para altas nos preços, mas a expectativa de escassez no fornecimento é uma preocupação crescente. O Brasil, por exemplo, terá que recorrer à importação de cacau, com navios já a caminho com novas cargas. As indústrias estão buscando rapidamente o que está disponível no mercado global, temendo que a falta de cacau se torne um problema significativo no futuro.
A situação atual comparada ao início do ano
No primeiro semestre de 2024, observou-se uma redução nos estoques, especialmente porque muitos contratos de cacau foram firmados a preços muito mais baixos no ano passado, como durante a Páscoa. Isso significa que o impacto dos preços altos ainda não havia alcançado o consumidor. No entanto, a partir de agosto, essa situação mudou completamente, e o relatório semestral mostrou que a demanda global continuava firme.
- A queima de estoques a preços antigos ajudou a mascarar os efeitos do aumento de preços.
- A oferta do cacau começou a minguar, refletindo no aumento das cotações nos mercados.
Como a indústria está se adaptando às novas condições do mercado?
A indústria tem buscado soluções criativas para lidar com esses aumentos nas cotações. Por exemplo, muitos produtos estão sendo ajustados para conter menos cacau, com a adição de biscoitos e frutas, o que pode tirar a classificação de “chocolate”. Isso se torna um dilema, pois as necessidades do consumidor continuam, mesmo com a dificuldade em equilibrar a oferta e a demanda.
Uma estratégia que está em ascensão é a redução do tamanho dos produtos. Por exemplo, consumidores que costumavam comprar chocolates com maior teor de cacau podem ter que optar por opções com menor percentual, buscando alternativas que ainda estejam dentro de suas faixas de preço.
Novos recordes de preços estão no horizonte?
É bastante provável que os próximos anos vejam novos recordes de preços em decorrência da imprevisibilidade da cadeia produtiva do cacau. Com cerca de 70% da produção mundial se concentrando em uma única região, fatores como crises climáticas podem ter um impacto devastador. Para 2025, as expectativas apontam para um ano de muita volatilidade nos preços.
Perspectivas futuras: O que está por vir?
Entretanto, nem tudo é desespero. Existe um copo meio cheio a ser explorado: um crescimento potencial e um aumento de investimentos nas áreas produtoras de cacau. É fundamental que haja um incentivo contínuo ao investimento nessas regiões, especialmente na África, onde a produção é crucial. O Brasil também começa a ganhar atenção, dado seu potencial produtivo.
A influência dos preços nos pequenos e médios produtores
Os preços elevados têm estimulado os produtores a buscarem alternativas para melhorar a produção. Eles estão investindo em tecnologia, capacitação e em novas práticas que potencializam a produtividade de suas lavouras. Essa mudança de mentalidade está ocorrendo mesmo em áreas onde o cacau não é tradicionalmente cultivado, como no Oeste da Bahia e em regiões do Centro-Oeste brasileiro.
Como minimizar as imprevisibilidades do mercado?
Para enfrentar a imprevisibilidade das safras, é fundamental implementar práticas de análise constante de solo e monitoramento das plantações. Muitas perdas poderiam ter sido prevenidas com um planejamento mais adequado e técnicas de manejo eficazes. O agronegócio do cacau precisa se adaptar à realidade das mudanças climáticas, utilizando a tecnologia para proteger e potencializar sua produção.
O papel das políticas públicas no equilíbrio do mercado
É essencial que haja políticas públicas que incentivem um aumento na produção de cacau, especialmente no Brasil. Acesso a crédito com condições favoráveis é crucial para permitir que produtores, independentemente do tamanho, possam investir em suas propriedades e ampliar sua produção.
A criação de mudas de cacau, por exemplo, é um ponto crítico que necessita de atenção. A demanda é altíssima, mas a produção atual de mudas nem de longe é suficiente para atender às metas desejadas.
Possibilidades a curto prazo
Embora intervenções do governo possam aparentemente oferecer soluções imediatas, é preciso ter cautela. A maioria das intervenções de preços acaba gerando distorções no mercado e efeitos negativos a longo prazo.
Em uma realidade onde a demanda por cacau continua crescente, o setor deve investir na inovação e na adoção de práticas sustentáveis. Dessa forma, poderemos garantir não apenas a continuidade da produção, mas também a satisfação do consumidor em um mercado que se mostra cada vez mais exigente.