
Imagens REDA/Getty
O setor alimentício brasileiro está passando por uma transformação significativa. Com mais de 41 mil empresas, representadas em sua maioria por pequenos e médios negócios, este segmento produz cerca de 283 milhões de toneladas de alimentos anualmente, gerando R$ 1,3 trilhão em receitas, conforme dados da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA).
Apesar desses números impressionantes, há um desafio crucial a ser enfrentado: fomentar a inovação no setor alimentício. Para isso, é essencial uma colaboração eficaz entre ciência, indústria e regulação, permitindo que novas tecnologias saiam dos laboratórios e cheguem de forma segura à mesa do consumidor.
Integração de Ciência, Indústria e Regulação
Nos últimos anos, surgiu uma crescente demanda por conectar esses três pilares — ciência, negócios e regulação. Um exemplo recente dessa sinergia foi o evento “Embrapa + InnovaReg — Impulsionando o Futuro da Alimentação”, realizado online no final de outubro. O evento reuniu pesquisadores, representantes do governo e da indústria de alimentos, com o objetivo principal de transformar conhecimento científico em inovação prática.
A discussão evidenciou a necessidade de alinhar o progresso tecnológico com as exigências regulatórias e a competitividade do setor. A regulação não deve ser vista como um entrave, mas sim como parte integrante da estratégia de inovação desde a concepção dos projetos, garantindo a proteção da saúde pública.
Parcerias que Valem a Pena
A colaboração entre instituições de pesquisa e empresas pode se dar de diversas formas. Os exemplos vão desde o desenvolvimento de novos ingredientes até a concessão de licenças para novas tecnologias e programas de inovação aberta.
Soluções inovadoras da Embrapa, como fibras alimentares extraídas de frutas, corantes naturais, proteínas alternativas, plataformas de extrusão sem glúten e embalagens inteligentes, evidenciam o potencial dessa colaboração. Porém, é vital implementar também marcos regulatórios que suportem essas inovações.
A regulação se tornou um pilar crítico para a credibilidade e competitividade do setor. O Brasil está em um processo de modernização normativa, onde agências como Anvisa e Mapa estão adotando tendências internacionais, como o reconhecimento de equivalência com órgãos estrangeiros e a criação de sandbox regulatório para processos mais ágeis.
Essas iniciativas têm o potencial de acelerar a introdução de ingredientes inovadores enquanto asseguram a conformidade e a segurança. Contudo, a indústria ainda precisa avançar na qualidade e na consistência dos processos submetidos aos órgãos reguladores para obter aprovações eficazes e resultados positivos no mercado.
Educação e Transparência: O Programa Comer com Ciência
No Brasil, uma iniciativa complementa o campo da educação e da confiança: o Programa Comer com Ciência, promovido pelo Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital/Apta) em parceria com a Fundepag. Este projeto busca transformar a relação das pessoas com a industrialização dos alimentos, apresentando explicações técnicas de maneira acessível.
Informações sobre a segurança e qualidade dos alimentos são cruciais para decisões alimentares mais conscientes. O programa busca conectar ciência, indústria e sociedade, mostrando que a aceitação de novos produtos depende tanto da inovação e regulação quanto de um diálogo transparente com o consumidor.
Aliando-se ao Exterior: Aprendizados Internacionais
A Europa, através da Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA), reconhece que seu trabalho não pode ser realizado apenas com recursos internos. É necessário transformar colaborações pontuais em parcerias duradouras. O programa de trabalho para 2024-2026 enfatiza a importância de parcerias entre organizações, alinhadas à abordagem One Health, que promove um equilíbrio sustentável entre a saúde de pessoas, animais e ecossistemas.
Somente por meio de colaborações que envolvem compartilhamento de conhecimento e dados, a União Europeia poderá manter seus altos padrões de segurança alimentar.
Um exemplo relevante aparece no Canadá. O Programa Canada’s Global Innovation Clusters conecta empresas, instituições de pesquisa e organizações sem fins lucrativos para acelerar o desenvolvimento de tecnologias e soluções com impacto social. O Protein Industries Cluster é um exemplo dentro desse programa, que abrange toda a cadeia de valor, desde a genética e pesquisa agrícola até a criação de produtos finais, focando em ingredientes e produtos à base de plantas.
Esse modelo inclui um centro de pesquisa regulatória, dedicado a apoiar os membros em questões legislativas e a facilitar a interação com as autoridades, melhorando a comercialização e a competitividade de inovações.
A Segurança como Impulsionadora da Inovação
Em 2024, a indústria alimentar brasileira investiu cerca de R$ 24,9 bilhões em inovação. A velocidade com que essas inovações são implementadas está atrelada a um ambiente de negócios seguro e à convergência regulatória. Para que novas soluções possam ganhar escala, é fundamental fortalecer parcerias público-privadas, aprimorar os processos regulatórios e garantir que as agências estejam adequadamente preparadas para lidar com as novas demandas.
Os debates recentes comprovam que essa integração é viável. A criação de espaços para o diálogo entre pesquisa, indústria e governo tem se mostrado eficaz para alinhar ciência, inovação e regulação, abrindo caminho para um sistema alimentar que seja sustentável, seguro e competitivo.
É essencial que, como profissionais da área, busquemos construir pontes entre pesquisa e negócios, enquanto colaboramos com os órgãos de saúde. Apenas assim podemos garantir que as inovações cheguem à mesa do consumidor com a segurança, transparência e conformidade necessárias.
*Amanda Poldi é nutricionista com um mestrado em educação nas profissões de saúde, atuando há mais de 24 anos na área de assuntos regulatórios e rotulagem. Ela é sócia-fundadora da Consultoria de Estratégia e Inovação em Regulatórios de Alimentos (INNOVAREG), e já atuou na vice-presidência da ABIA e do ILSI Brasil, além de ter presidido o Comitê de Qualidade de Óleos e Gorduras da Abiove.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.




