Proposto em 1977, pela socióloga alemã Elisabeth Noell – Neumann, a Espiral do Silêncio é um termo utilizado para descrever um fenômeno que é característico da conduta da mídia. Consiste em inibir as opiniões indesejadas, ou seja, contrárias às opiniões daquele órgão de imprensa em particular, transmitindo a impressão de que elas são minoritárias e de que expressá-las em público pode trazer isolamento e até marginalização. Assim, os indivíduos ficam temerosos em declarar abertamente suas ideias, porque elas já foram preliminarmente taxadas como irrelevantes, embora em primeira análise não aja meios de averiguar a veracidade dessa impressão.
Na particularidade brasileira, a presença do ente descrito por Noell aufere soberbos níveis de visualidade. Pois é justamente a Opinião majoritária que está sendo rotulada como minoritária, logo, marginalizada. Vê-se pelas pesquisas de opinião realizadas pelo Instituto Datafolha. Em 2020, um estudo encomendado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), mostra que aproximadamente 86% dos brasileiros se declaram cristãos, 53% católicos e 33% evangélicos. Apenas 8% disseram não ter filiação religiosa. Outra pesquisa realizada pela mesma instituição, em 2021, afirmou que 54% dos entrevistados se opunham à legalização do aborto, enquanto apenas 36% se diziam a favor. Além disso, 51% dos entrevistados disseram ser contra uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, enquanto 45% mostravam-se favoráveis. Esses dados sugerem que os brasileiros tendem a ser conservadores em questões sociais e morais.
No entanto, desde a década de 1970, com a consolidação da rede televisiva mainstream, que a partir de então vem adotando pautas gradativamente mais orientadas ao progressismo em sua dramaturgia e grade de programas, o Brasil vê-se órfão de uma organização midiática que represente os reais anseios da população média. Há ainda a acepção do excecional, do raro, do divergente ou do anormal no que concerne à visão de mundo expressa pelo cidadão ordinário, com uma vaga tonalidade de que somente pessoas exóticas ou mentalmente perturbadas podem aderir a essas ideias, a não ser que estejam diretamente interessadas em determinados movimentos, quiçá sejam financiadas para isso. Tal proposição torna-se evidente ao analisarmos o retrato de núcleos familiares tradicionais nas telenovelas. Quase sempre disfuncionais, nota-se uma áurea de insinuações malévolas que não são apresentadas ostensivamente, mas ficam na atmosfera do enredo como uma ameaça rarefeita, ao passo que se relata com certo entusiasmo configurações alternativas.
Retornando ao campo da abstração conceitual, é importante que a intimidação gestada pela aparente hegemonia permaneça subliminar, porque caso se explicite muito, corre-se o risco de que a mesma venha a ser objeto de discussão, o que seria a antítese do movimento, como o próprio nome sugere de caráter silencioso. Trata-se de um jogo de impressões e emoções vagas, não aludindo propriamente a um processo de doutrinação ideológica, termo em voga e, portanto, não surpreendentemente banalizado, que em sua justa acepção baseia-se na imbuição dogmática.
Para que a espiral se imponha, basta haver uma coesão entre as concepções veiculadas pelos grandes comunicadores institucionais, que em conjunto operam de modo a excluir ideais desconformes a sua orientação primária, negando-lhes a possibilidade de expressão direta, mas sempre transmitindo-os de maneira caricatural por olhos alheios, descomprometidos intelectualmente e emocionalmente com eles. Pela prática da confirmação recíproca, esse pequeno grupo acaba metamorfoseando a sua interpretação da realidade, no padrão opinativo aceito naquela sociedade, via a simples passagem do tempo, onde gestam-se novas gerações, submissas a uma agora concretamente homogênea vontade. Porém, o advento da informação descentralizada e distribuída, possibilitada pela revolução técnico-informacional, aparenta ter comprometido as estruturas da comunicação de massa, sendo decisória inclusive em eleições presidenciais, como a americana de 2016 e a brasileira em 2018. De todo modo, ainda é cedo para mensurar os efeitos desencadeados pela “livre” comunicação instantânea. Sem dúvidas, um dos cenários mais otimistas passa-se na cabeça do CEO do Twitter e da SpaceX, Elon Musk, que almeja transformar a plataforma homônima da Big Tech em uma espécie de Ágora contemporânea em escala global. Ao menos é neste sentido em que se tem pronunciado. Ou talvez cheguemos à conclusão do escritor e filosofo italiano Umberto Eco: “a internet deu voz aos imbecis”.