### O Impacto das Mudanças Climáticas na Agricultura do Cacau na Amazônia
O que deveria ser um tempo de colheita generosa em março se transformou em um alerta sobre os desafios impostos pelas mudanças climáticas na Amazônia. Na região do Xingu, no Pará, os produtores de cacau estão enfrentando um verdadeiro desafio, que ameaça práticas agrícolas que foram passadas por gerações.
#### Uma Seca que Desafia a Tradição
A seca extrema de 2024 é apenas um dos muitos eventos climáticos que têm transformado a vida na região. A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) declarou estado crítico de escassez hídrica nos rios Xingu e Iriri, com uma seca que se estendeu além do esperado, isolando comunidades que sempre confiaram na regularidade de suas águas.
### O Novo Padrão Climático
Para os agricultores de cacau, essa alteração nos padrões climáticos não é apenas um aborrecimento. O cacaueiro, planta nativa da Amazônia, sempre prosperou sob condições específicas: calor moderado, umidade alta e chuvas frequentes. Historicamente, a região de São Félix do Xingu experimentava uma estação chuvosa de 7,2 meses, de outubro a maio, com picos de precipitação em março. Porém, esse padrão tem se tornado cada vez mais errático.
> “O cacau é extremamente sensível às mudanças”, afirma Robson Brogni, da Ascurra, que possui chocolates premiados. “Qualquer alteração no padrão de chuvas ou temperaturas acima do normal afeta não apenas a planta, mas também o nosso bolso.”
Agora, as temperaturas em Altamira, que antes variavam entre 20°C e 36°C, frequentemente ultrapassam 39°C durante os meses mais quentes. A estação seca que costumava durar 4,8 meses tem se alongado, deixando o solo árido por períodos cada vez maiores.
### Projeções Alarmantes para o Futuro
Pesquisas científicas confirmam os receios dos produtores. Um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) aponta que, até 2050, as mudanças climáticas podem reduzir em até 73% as áreas disponíveis para o cultivo de cacau na Amazônia. Com a diminuição das chuvas e o aumento das temperaturas, a região está se tornando cada vez mais árida, comprometendo uma agricultura que sempre se baseou na abundância hídrica.
Essa nova realidade está forçando os agricultores do Xingu a adaptarem suas práticas quase todos os anos. O verão, que costumava se estender até dezembro, agora se transformou em um ciclo confuso, com colheitas previstas para março a agosto.
### Impactos Diretos na Produção e na Comunidade
O cacau do Xingu não é apenas uma commodity; é um produto altamente valorizado mundialmente por suas características únicas. As amêndoas da Gleba Assurini são conhecidas pelo sabor intenso e equilíbrio entre amargor e teor de manteiga, qualidades dependentes das condições climáticas que estão mudando.
Adicionalmente, a região do Xingu é responsável por 75,86% da produção de cacau do Pará, enquanto o estado contribui com mais da metade da produção nacional. Em 2024, o Pará alcançou uma média de 946 kg por hectare, bastante superior à média da Bahia, que ficou em 250 kg. Essa produtividade faz do Xingu uma região crítica para a manutenção da indústria cacaueira no Brasil.
Entretanto, o impacto das mudanças climáticas vai além da produção agrícola. Comunidades ribeirinhas, como as da Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio, testemunharam incêndios em áreas que até então permaneciam livres de fogo. O nível dos rios, que serve como principal via de transporte, caiu drasticamente, isolando famílias e dificultando o escoamento de suas produções.
### O Reflexo Global das Mudanças
O que está acontecendo no Xingu não é uma situação isolada. É parte de um quadro mais amplo que afeta a cadeia produtiva do cacau globalmente. Dados da UNCTAD revelam que o preço do cacau subiu 136% entre julho de 2022 e fevereiro de 2024, consequência direta da escassez provocada por eventos climáticos extremos.
Na África Ocidental, onde está concentrada a maioria dos cultivos mundiais, a combinação de chuvas irregulares, aumento de temperatura e novas condições de umidade está ameaçando a produtividade das plantações.
Além disso, pesquisas indicam que o desmatamento na região do Rio Xingu pode comprometer em até 7% a precipitação média anual do Mato Grosso, provando que a devastação localizada tem impactos em larga escala. Para os agricultores de cacau, isso significa que proteger a floresta é, na verdade, uma urgência econômica.
### Estratégias para Enfrentar os Desafios
Frente a esses desafios, os produtores estão inovando. Eles estão testando variedades de cacau que são mais resistentes ao calor e à seca, investindo em sistemas de irrigação e explorando técnicas agroflorestais que ajudam a reter a umidade do solo. Essas práticas não só contribuem para a preservação da umidade, mas também oferecem alternativas de renda por meio do cultivo de outras espécies.
> “Aprendemos que não podemos depender apenas do cacau”, explica Robson Brogni. “É preciso diversificar e criar sistemas que resistam às mudanças.”
Organizações como a SWISSCO ressaltam que a adaptação às mudanças climáticas é um desafio urgente para todo o setor cacaueiro. Temperaturas extremas e padrões climáticos imprevisíveis impactam tanto o volume quanto a qualidade da produção globalmente.
### Um Futuro Incerto, mas Esperançoso
Em 2025, espera-se que o Brasil produza cerca de 300 mil toneladas de cacau, com a região Norte mantendo sua posição de liderança, representando 56,4% da produção nacional. Contudo, esses números estão intimamente ligados à capacidade dos produtores de se adaptarem às novas condições climáticas. O Xingu, como principal região produtora, será essencial para determinar se essas metas serão atingidas.
A transformação climática em curso no Xingu é um microcosmo dos desafios que a agricultura tropical enfrentará nas próximas décadas. A habilidade de resiliência demonstrada pelos produtores locais pode servir de inspiração para outras regiões, mas também destaca a necessidade urgente de ações coordenadas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas sobre a segurança alimentar global.
Ao pensarmos sobre esses desafios, é fundamental que nos unamos para encontrar soluções. E você, o que acha que pode ser feito para ajudar na preservação da produção de cacau e na adaptação das práticas agrícolas? Compartilhe suas ideias e reflexões nos comentários!




