domingo, dezembro 22, 2024
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Alugar Cotas de Fundos Imobiliários: Uma Jogada Inteligente ou Um Risco Desnecessário?

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Aluguel de Fundos Imobiliários: Uma Nova Onda de Investimentos

Introdução ao Aluguel de FIIs

Uma nova maneira de investir veio à tona e está cativando a atenção de diversos investidores no mercado financeiro: o aluguel de Fundos Imobiliários (FIIs). Aprovada em novembro de 2020, essa modalidade já possui uma considerável aceitação na bolsa de valores brasileira. Entretanto, entender se essa estratégia é realmente vantajosa para sua carteira requer um olhar detalhado sobre o funcionamento desse tipo de operação.

O que é Aluguel de FIIs?

O conceito de aluguel de FIIs refere-se à prática em que um investidor aluga suas cotas de um fundo imobiliário a um terceiro por um prazo determinado. Os termos do aluguel, como a taxa a ser paga e o período de locação, são definidos em um contrato, que geralmente tem uma duração em torno de um mês. Essa operação torna-se uma alternativa para aqueles que desejam investir em fundos imobiliários, oferecendo vantagens tanto para os locadores quanto para os tomadores.

Como Funciona na Prática

Essas transações são sempre intermediadas pela B3 (Brasil, Bolsa, Balcão), que é a administradora do mercado. Imagine a seguinte situação: você possui cotas de um fundo imobiliário e decides alugá-las. Neste caso, você será o "doador" e aquele que aluga suas cotas será chamado de "tomador".

Assim como em um aluguel de imóveis, o doador, parecido com o locador, é aquele que cede as cotas, enquanto o tomador se assemelha ao locatário, que utiliza as cotas por um determinado período.

Características Importantes do Aluguel de FIIs

Ao se aventurar no aluguel de FIIs, é fundamental entender as características que envolvem essas transações:

  • Intermediação pela B3: Todas as operações devem ser realizadas sob os mecanismos da B3, o que garante a legitimidade do processo.
  • Garantia do Pagamento: O tomador deve demonstrar que possui capital suficiente para efetuar o pagamento pela cota na data acordada. Isso é uma proteção para o doador.
  • Proibição para Grandes Investidores: Aqueles que possuem mais de 10% do capital de um fundo não podem alugar suas cotas. Essa norma visa evitar a isenção de impostos sobre os rendimentos.

Impostos e Proventos

É importante mencionar que os lucros provenientes do aluguel estão sujeitos à tributação. Contudo, rendimentos de pessoas físicas podem ficar isentos de impostos, enquanto os ganhos de capital são impactados por uma alíquota regressiva, variando entre 22,5% e 15%.

Uma das vantagens para o doador é que os proventos distribuídos pelo fundo durante o período do aluguel pertencem ao doador, mesmo que as cotas estejam alugadas. Isso significa que, enquanto você aluga suas cotas, ainda recebe os dividendos gerados pelo fundo.

Vantagens e Desvantagens do Aluguel de FIIs

Como em qualquer estratégia de investimento, o aluguel de FIIs traz consigo um conjunto de benefícios e riscos que merecem consideração.

Vantagens para o Doador

  • Renda Adicional: O doador recebe a taxa acordada pelo aluguel, aumentando assim sua renda passiva.
  • Diversificação: Ao alugar suas cotas, o investidor diversifica sua carteira sem precisar vender as cotas efetivamente.

Vantagens para o Tomador

  • Lucro com as Variações: O tomador pode lucrar com a venda da cota em um preço mais alto e recomprá-la por um valor inferior, mantendo a diferença como lucro.
  • Participação em Assembleias: Aqueles que buscam mais influência em assembleias podem alugar cotas para aumentar sua quantidade e, assim, seu voto.

Riscos Envolvidos

  • Volatilidade do Mercado: O aluguel de FIIs é uma prática que exige conhecimento do mercado. A instabilidade pode gerar prejuízos.
  • Obrigações financeiras: O tomador deve estar ciente de que terá que devolver a cota ou o valor correspondente, o que pode acarretar em perdas se o mercado se comportar de forma inesperada.

Exemplos Práticos de Aluguel de FIIs

Para ilustrar melhor como funciona, imagine que um investidor, que chamaremos de "A", possui uma carteira composta por diversos fundos imobiliários. "A" decide alugar suas cotas e inicia o contato com a corretora.

Após formalizar o desejo de locação, "A" recebe propostas para alugar suas cotas, que geralmente variam entre 1% e 3% do valor total das cotas em questão. Após assinar os termos necessários, ele pode alugar suas cotas e ganhar uma receita adicional.

Essa operação pode ser feita de forma simplificada e automatizada pela corretora, tornando o processo ainda mais acessível a investidores que desejam maximizar seus ganhos.

Reflexões Finais

O aluguel de fundos imobiliários é uma estratégia que promete ampliar as possibilidades de ganhos no mercado financeiro. Para os doadores, a prática se mostra vantajosa, proporcionando renda extra sem abrir mão do controle sobre suas cotas.

Entretanto, a complexidade do mercado exige conhecimento e uma análise minuciosa antes de se aventurar nas operações de aluguel. Para aqueles que se sentem preparados, o aluguel de FIIs pode ser uma excelente maneira de diversificar investimentos e aumentar rentabilidade.

E você, já pensou em como o aluguel de FIIs pode mudar sua forma de investir? Compartilhe suas experiências e dúvidas nos comentários! Vamos conversar sobre as melhores estratégias para navegar nesse novo horizonte de investimentos.

Responsabilidade Fiscal e Ajuda Social: Como Equilibrar a Economia Sem Prejudicar os Mais Pobres

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A pandemia de Covid-19 causou um choque econômico global de proporções inéditas, afetando simultaneamente oferta e demanda e provocando uma crise humanitária significativa. Para conter esses impactos, os governos ao redor do mundo investiram em programas de auxílio para preservar a renda e o emprego, como o auxílio emergencial. No Brasil, esses programas representam quase 10% do PIB em 2020, um dos maiores gastos entre os países emergentes, comparável aos níveis de economias desenvolvidas como Estados Unidos, Canadá e Alemanha.

Com um déficit fiscal crescente e a dívida pública se aproximando de 100% do PIB, muitos questionam se o Brasil deve manter o teto de gastos e o ajuste fiscal ou permitir a continuidade dos programas de transferência de renda. Acredita-se que ajudar os mais necessitados e manter a responsabilidade fiscal são objetivos opostos, mas essa visão pode ser simplista. Feitas as escolhas certas, esses objetivos podem ser complementares, e a falta de controle fiscal acaba prejudicando muito mais os pobres do que os ricos.

O Teto de Gastos e a Flexibilidade em Tempos de Crise

A Emenda Constitucional 95, também conhecida como o teto de gastos, foi criada para impor previsibilidade ao crescimento das despesas públicas ao longo de 20 anos. Essa medida buscou promover o ajuste fiscal gradual, com o objetivo de reduzir as taxas de juros reais e evitar um aumento na carga tributária. Com a chegada da pandemia, muitos questionaram se o teto de gastos impediria a criação de medidas emergenciais.

Contudo, o teto de gastos inclui uma flexibilização para casos de calamidade pública ou pandemias, permitindo despesas extraordinárias para lidar com situações atípicas. Dessa forma, o governo pôde implementar o auxílio emergencial, que chegou a transferir R$ 50 bilhões por mês no auge do programa, 20 vezes o valor médio mensal do Bolsa Família. Esses gastos, embora elevados, foram feitos dentro da legalidade e sem comprometer a responsabilidade fiscal a longo prazo, pois o teto visa a despesas recorrentes, não emergenciais.

Em um contexto em que o déficit nominal consolidado deve fechar em 16% do PIB e a relação dívida/PIB se aproxima de 100%, é crucial manter o teto de gastos para garantir recursos permanentes para educação, saúde, segurança e programas de transferência de renda. O aumento temporário do déficit durante a pandemia foi necessário, mas uma política de expansão fiscal sem controle tornaria insustentável a retomada econômica e o financiamento de serviços públicos essenciais.

Expansão do Bolsa Família e Implementação do Renda Cidadã: Uma Questão de Priorização

O Bolsa Família, com reconhecimento internacional pela eficiência, beneficia cerca de 13 milhões de famílias no Brasil. Em 2021, a proposta orçamentária prevê o aumento no número de beneficiários para 15 milhões de famílias, o que elevará o gasto de R$ 29 bilhões para R$ 34 bilhões anuais. Há também discussões sobre a criação do Renda Cidadã, que visa expandir a rede de proteção social com um benefício médio de R$ 300, demandando um adicional de R$ 15 bilhões.

Para viabilizar essa expansão sem comprometer o teto de gastos, diversas estratégias estão sendo discutidas. Uma delas é a racionalização de outros programas sociais de menor eficiência, redirecionando os recursos para o Bolsa Família ou o Renda Cidadã. Outra proposta, apresentada no estudo Programa de Responsabilidade Social: Diagnóstico e Propostas, sugere ajustes para ampliar a rede de proteção social sem romper com o teto.

Além dessas alternativas, a aplicação efetiva do teto remuneratório no setor público também pode liberar recursos consideráveis. Atualmente, muitos funcionários do Judiciário e do Ministério Público recebem acima do teto constitucional de R$ 39.300. Aplicar essa regra de forma rigorosa, como sugerem estudos do CNJ, TCU e Ministério da Economia, poderia gerar economias de até R$ 15 bilhões, que poderiam ser redirecionadas para programas sociais.

Redução de Incentivos Fiscais: Uma Solução de Longo Prazo

Outro ponto crucial para a responsabilidade fiscal é a revisão dos incentivos fiscais. Em 2019, o governo federal abriu mão de mais de R$ 330 bilhões em arrecadação por meio de renúncias fiscais, enquanto os estados deixaram de arrecadar R$ 91,7 bilhões. Esses incentivos, concedidos muitas vezes a setores específicos como fábricas de refrigerantes na Zona Franca de Manaus, têm baixa eficiência econômica e beneficiam setores já estabelecidos.

Rever esses incentivos fiscais, mantendo apenas aqueles com impacto econômico comprovado, não resolve o problema do teto de gastos, mas melhora a performance fiscal a longo prazo. Com uma gestão mais eficiente, esses recursos poderiam financiar programas que beneficiem diretamente a população de baixa renda, reduzindo a necessidade de novos impostos e promovendo maior justiça social.

O Impacto do Desajuste Fiscal na População de Baixa Renda

A manutenção do equilíbrio fiscal é fundamental para proteger a população de baixa renda dos efeitos adversos do desajuste. Caso a situação fiscal se deteriore, o governo precisará aumentar os juros para atrair investidores, e cada ponto percentual de aumento na taxa de juros significaria um custo adicional de cerca de R$ 70 bilhões. Esse montante é equivalente a duas vezes o orçamento anual do Bolsa Família, o que limita o espaço para políticas sociais.

Além disso, uma crise fiscal pressiona a inflação e desvaloriza o real, aumentando o custo de vida. Os mais afetados por esses efeitos são justamente os que dependem dos serviços públicos e de uma economia estável para sua subsistência. A classe de renda mais alta, por sua vez, pode se beneficiar com juros elevados em investimentos atrelados ao CDI.

A piora na situação fiscal ainda ameaça a geração de empregos, prejudicando principalmente trabalhadores de baixa qualificação e reduzindo as oportunidades de quem mais precisa. Em um cenário de descontrole fiscal, a capacidade de recuperação econômica fica comprometida, reduzindo as chances de uma recuperação robusta para a população de baixa renda.

Responsabilidade Fiscal e Sensibilidade Social: Um Caminho Necessário

A responsabilidade fiscal e a sensibilidade social não são objetivos excludentes. Com escolhas conscientes, é possível criar uma política fiscal que priorize os mais vulneráveis, mantendo ao mesmo tempo o equilíbrio financeiro. A situação atual exige coragem para enfrentar grupos de interesse que buscam preservar privilégios e desviar recursos que poderiam melhorar a vida dos que mais precisam.

É essencial que o governo mantenha o teto de gastos e promova reformas estruturais que eliminem privilégios, ampliem a eficiência dos programas sociais e garantam uma rede de proteção social sustentável. O desajuste fiscal prejudica os mais pobres, e a responsabilidade fiscal é a melhor forma de proteger a população vulnerável dos riscos econômicos.

Com o uso racional dos recursos e a eliminação de privilégios, o Brasil pode expandir o Bolsa Família, implementar o Renda Cidadã e fortalecer os programas sociais sem comprometer o orçamento público.

Crise, Reforma e Privilégios no Brasil: O Desafio de Enfrentar o Déficit Fiscal e a Desigualdade

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As projeções indicam que o Brasil terá uma das maiores quedas de PIB das últimas décadas em 2020, próxima a -5%, embora abaixo da média de outros países desenvolvidos e emergentes, com exceção da China. Em contrapartida, o país aplicou um estímulo fiscal significativo, superior a 8% do PIB, o segundo maior da América Latina, atrás apenas do Peru. No entanto, isso trouxe um aumento expressivo no déficit fiscal, que saltou de uma previsão inicial de R$ 115 bilhões para mais de R$ 800 bilhões, com a dívida pública se aproximando perigosamente de 100% do PIB.

Enquanto outros países também ampliaram seus déficits, o Brasil enfrenta dificuldades únicas. A fragilidade fiscal histórica do país obriga o governo a pagar juros altos em comparação com outras economias, como Japão, EUA e países europeus, que oferecem taxas próximas de zero em títulos de longo prazo. Com isso, o Brasil mantém juros altos em dívidas de 10 anos, acima de 8% ao ano, refletindo uma insegurança que afeta a taxa de câmbio e contribui para a desvalorização do real, que já superou a de outras moedas emergentes em 2020.

Essa crise não começou com a pandemia. Desde a recessão de 2015 e 2016, com quedas de -3,5% e -3,3% no PIB, o Brasil já demonstrava baixo crescimento e enfrentava desafios fiscais. Mesmo antes da Covid-19, reformas amplas e estruturais eram reconhecidas como essenciais para um crescimento sustentável. No entanto, em meio a discussões sobre a manutenção do teto de gastos, a reforma administrativa e a reforma tributária, setores públicos e privados se esforçam para preservar privilégios que perpetuam o baixo crescimento e dificultam o ajuste fiscal.

O Teto de Gastos e a Pressão Corporativa

Instituído pela Emenda Constitucional 95 em 2016, o teto de gastos foi criado para conter o crescimento das despesas públicas por uma década, sem a necessidade de aumentar a carga tributária. Essa política promoveu uma redução gradual das taxas de juros e ajudou a estabilizar as contas públicas no curto prazo.

Contudo, a resistência ao teto de gastos é visível. Em 2019, 7 dos 8 tribunais federais não cumpriram seus tetos individuais, e o Poder Executivo teve que compensar o excesso de gastos do Judiciário. Em 2020, apesar da crise econômica, a pressão por gastos públicos permaneceu forte. Não se trata apenas dos programas essenciais de auxílio emergencial, mas de aumentos salariais para corporações públicas que tradicionalmente recebem acima da inflação.

Em agosto de 2020, o Tribunal de Contas da União e o Congresso Nacional aprovaram uma abertura de crédito suplementar de R$ 166,8 milhões para o Ministério Público da União (MPU), destinado a cobrir despesas como auxílio-moradia. Além disso, o Poder Judiciário solicitou autorização para usar R$ 500 milhões das custas processuais para aumentar o seu teto de gastos, uma ação que representa o esforço constante de aumentar despesas dentro de um cenário de restrição orçamentária.

Essas exceções ao teto de gastos comprometem a efetividade da regra e desviam recursos que poderiam beneficiar a população em áreas essenciais, como saúde e educação. Com altos salários e benefícios adicionais, setores como o Judiciário e o MPU seguem pressionando o orçamento e minando o objetivo de estabilidade fiscal proposto pela EC 95.

A Necessidade de uma Reforma Administrativa Abrangente

O Brasil segue padrões defasados em relação a outros países que modernizaram suas administrações públicas. Na última década, países como Austrália, Nova Zelândia, Inglaterra, Portugal e Chile realizaram reformas em suas máquinas públicas, buscando melhorar a eficiência e alinhar os incentivos à produtividade. No entanto, o Brasil continua com uma estrutura pública marcada por altos salários, progressões automáticas e estabilidade incondicional, que muitas vezes se traduz em proteção ao desempenho inadequado.

A recente proposta de reforma administrativa, que incide apenas sobre novos servidores e somente no Poder Executivo, limita-se a uma ação superficial que não resolve as distorções atuais. O Congresso Nacional é chamado a ampliar o alcance dessa reforma, incluindo todos os poderes e carreiras, a fim de corrigir as desigualdades e aplicar efetivamente o teto remuneratório. Reformas bem-sucedidas em outros países indicam que uma administração pública mais eficiente é essencial para a prestação de melhores serviços e para a sustentabilidade fiscal.

A Reforma Tributária e o Fim dos Privilégios Fiscais

Os privilégios no Brasil não se limitam ao setor público. Apenas em 2019, a União deixou de arrecadar R$ 330,6 bilhões em incentivos fiscais, enquanto os estados abriram mão de R$ 91,7 bilhões em receitas por meio de renúncias fiscais. O sistema tributário brasileiro é altamente complexo, com mais de 100 regimes especiais apenas para PIS e Cofins, criando uma rede de isenções que beneficia poucos setores, sem retorno significativo para a economia.

A ineficiência dos incentivos fiscais é evidente em casos como a isenção tributária para atum e caviar, itens que recebem o mesmo benefício que produtos da cesta básica, como feijão e arroz. Além disso, o país oferece isenções generosas para investidores de alta renda, que não pagam impostos sobre dividendos, enquanto os trabalhadores de baixa renda arcam com uma carga tributária desproporcional sobre o consumo.

Uma reforma tributária que elimine esses privilégios é urgente. A complexidade do sistema e a concessão de benefícios para grupos com forte influência política aumentam a desigualdade na distribuição da carga tributária e prejudicam o desenvolvimento econômico. Políticas que visem corrigir essas distorções são essenciais para um crescimento inclusivo e justo.

A Crise e a Oportunidade de Reformas Necessárias

A crise de 2020 trouxe enormes desafios, mas também uma oportunidade única de realizar reformas significativas que o Brasil precisa há anos. Em meio à perda de milhões de empregos e à pressão sobre o sistema de saúde, o país deveria consolidar um esforço nacional para reduzir privilégios e promover a igualdade de oportunidades.

No entanto, o que se vê são grupos poderosos buscando preservar ou ampliar seus benefícios. Para que o Brasil possa superar a crise e promover o crescimento, é necessário encarar de frente os interesses corporativos que se beneficiam de uma estrutura fiscal e administrativa desigual. A manutenção do teto de gastos, a reforma administrativa e uma reforma tributária que elimine privilégios são fundamentais para construir um país com maior justiça social e equilíbrio fiscal.

A experiência de crises passadas, como a de 2015 e 2016, mostrou que, sem reformas estruturais, o Brasil ficará preso em um ciclo de baixo crescimento e endividamento. Ao invés de preservar o status quo, o Brasil deve aproveitar este momento para construir uma economia mais inclusiva e eficiente.

 

A Realidade de Alan e Jean: Por que o Teto Salarial no Serviço Público é Crucial para a Mobilidade Social no Brasil

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Recentemente, reportagens do jornalista Tiago Boff, do jornal Zero Hora no Rio Grande do Sul, trouxeram histórias comoventes que ilustram a dura realidade da mobilidade social no Brasil. Nas matérias, conhecemos Alan e Jean, meninos de 11 e 16 anos, que estudam em condições improvisadas e difíceis para sonhar com um futuro melhor que o de seus pais. Em outra reportagem recente, a Folha de São Paulo apresentou dados sobre a disparidade salarial no setor público, revelando que, entre setembro de 2017 e abril de 2020, houve mais de 13 mil pagamentos mensais acima de R$ 100 mil a juízes, um valor muito superior ao teto salarial constitucional de R$ 39,3 mil.

Essa relação entre as histórias de Alan e Jean e o teto salarial no setor público revela um Brasil onde muitos ainda sofrem para estudar e construir uma vida digna, enquanto uma elite do funcionalismo público dribla os limites legais de remuneração. É um paradoxo que ilustra como a desigualdade no país se reflete em diferentes esferas e, muitas vezes, impede o avanço de políticas que promovam uma sociedade mais justa.

Alan e Jean: Um Futuro Melhor Através da Educação

Alan Somavilla, de 11 anos, mora na área rural do município de Estrela Velha, no Rio Grande do Sul, e cursa o sexto ano em uma escola pública estadual. Diante da pandemia e da necessidade de ensino remoto, seus pais, agricultores, improvisaram um espaço com uma lona plástica no meio da lavoura para que ele pudesse estudar e captar o sinal de internet. A mãe de Alan, Dejanira, contou ao jornal Zero Hora que quer garantir um futuro melhor para o filho, pois não teve a oportunidade de estudar e sabe a importância da educação.

A diretora da escola, Giovana Carvalho Dalcin, sensibilizada pela situação, registrou a cena e levou a história à imprensa para expor as dificuldades que muitos jovens enfrentam para estudar. A história de Alan é apenas uma entre muitas, que mostram como a educação pública é uma das únicas vias de mobilidade social para as famílias de baixa renda no Brasil.

A cerca de 200 km de distância, Jean Carlo Araldi, de 16 anos, também enfrenta desafios para estudar. Morando em uma região rural de União da Serra, ele sobe o morro para captar sinal de internet e assistir às aulas. Com o apoio de seus pais, que destinaram parte de sua renda mensal para comprar um receptor de internet, Jean continua buscando uma educação que possa abrir portas para uma vida melhor. Ambos os casos destacam o esforço e a perseverança das famílias para romper o ciclo de pobreza, um objetivo que é dificultado pelas desigualdades estruturais no Brasil.

Teto Remuneratório, Teto de Gastos e a Realidade do Serviço Público

No setor público brasileiro, o teto salarial foi implementado em 2003 com a reforma da previdência, estabelecendo um limite de R$ 39,3 mil, equivalente ao salário de um Ministro do Supremo Tribunal Federal. Contudo, ao longo dos anos, diversos benefícios e auxílios foram adicionados à remuneração de algumas carreiras, permitindo que funcionários de alto escalão recebam valores muito superiores ao teto.

O levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelou que mais da metade dos 26.177 juízes analisados no Brasil recebe salários acima do teto constitucional. Entre setembro de 2017 e abril de 2020, ocorreram 13.595 pagamentos mensais superiores a R$ 100 mil. Esse cenário reforça a ideia de que, enquanto a grande maioria dos servidores públicos, como professores de escolas estaduais, ganha bem abaixo do teto, há uma elite que se beneficia de altos salários que pesam no orçamento público.

Essa desigualdade nas remunerações dentro do próprio setor público dificulta ainda mais a implantação de políticas que beneficiem aqueles que mais precisam, como os professores que recebem, em média, R$ 2.500,00 mensais. Essa disparidade levanta uma questão: como justificar aumentos salariais para a base do funcionalismo enquanto uma pequena parcela recebe salários exorbitantes?

A Relação entre o Teto Salarial e o Teto de Gastos

O teto de gastos, implementado em 2016, é uma medida para controlar as despesas públicas e evitar o crescimento desenfreado da dívida pública. Embora alguns críticos apontem que o teto de gastos compromete investimentos em áreas essenciais, como educação e saúde, uma das principais ameaças à sua sustentabilidade é o próprio desrespeito ao teto salarial. Em 2019, antes da pandemia, 7 dos 8 tribunais federais ultrapassaram os limites de gastos, e foi o Poder Executivo que teve que cobrir o excesso, comprometendo recursos destinados a outras áreas fundamentais.

Ainda que muitos argumentem que os salários acima do teto representam uma fração pequena do orçamento total, esse desrespeito gera uma pressão inflacionária nos salários públicos e, consequentemente, no orçamento total do funcionalismo. Assim, a falta de controle sobre esses salários não apenas contribui para o aumento da massa salarial, mas também retira a capacidade de investir em programas que favoreçam a população de baixa renda.

A Reforma Administrativa e a Necessidade de um Teto Salarial Real

A proposta da reforma administrativa traz a possibilidade de corrigir algumas das distorções presentes no setor público brasileiro. Embora o governo tenha anunciado que a reforma impactará apenas os novos servidores, há uma esperança de que o Congresso possa incluir também regras para os servidores atuais, com medidas que possam regular as remunerações acima do teto.

Aplicar o teto salarial de maneira ampla e rigorosa ajudaria a economizar recursos e reduzir as pressões por aumentos salariais, tornando o setor público mais justo e eficiente. Essa medida também diminuiria a pressão para acabar com o teto de gastos, permitindo que mais recursos sejam direcionados para áreas como educação e saúde, onde estão as maiores demandas sociais.

Além disso, uma reforma que contemple o teto salarial como uma medida universal no setor público ajudaria a criar um ambiente de igualdade entre diferentes categorias. Ao implementar um teto real, o Brasil estaria dando um passo importante para garantir que os recursos públicos sejam usados de forma mais equitativa e responsável.

Por que um Teto Salarial é Importante para o Brasil de Alan e Jean?

No Brasil, histórias como as de Alan e Jean mostram a urgência de investimentos em educação e apoio para as famílias de baixa renda. O teto salarial no setor público representa não apenas um controle fiscal, mas uma questão de justiça e igualdade. Ao limitar os altos salários de uma elite no funcionalismo, o Brasil poderia redirecionar recursos para programas que beneficiem os mais vulneráveis.

A mobilidade social no Brasil ainda é uma das mais difíceis do mundo. Para que histórias como as de Alan e Jean não sejam a regra, é preciso garantir que o orçamento público priorize as necessidades básicas e invista em oportunidades que rompam o ciclo de pobreza. O teto salarial, quando respeitado, pode ser uma ferramenta eficaz para viabilizar um orçamento mais justo e eficiente, beneficiando aqueles que mais precisam.

O Brasil precisa de uma administração pública que atenda à realidade da maioria, e não aos interesses de uma minoria privilegiada. Aplicar o teto salarial é um passo necessário para construir um país onde crianças como Alan e Jean tenham uma chance real de alcançar uma vida melhor, sem precisar enfrentar tantas adversidades.

Desigualdade e Liberalismo no Brasil: Como Construir um País com Igualdade de Oportunidades para Todos

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Nas últimas semanas, o caso de racismo envolvendo um motoboy e um morador de classe média alta em Valinhos, São Paulo, trouxe à tona o tema da desigualdade social no Brasil. O episódio, amplamente divulgado nas redes sociais, expôs não só a violência das palavras, mas também a realidade de um país onde nascer em uma condição social privilegiada pode ser o fator mais determinante de sucesso na vida.

Ao ser confrontado pelo motoboy sobre sua condição social, o morador admitiu que já havia nascido com privilégios e que o entregador “nunca teria o que ele tem”. A frase reflete uma dura realidade no Brasil: a desigualdade social é muito menos uma questão de mérito ou esforço individual e muito mais uma consequência da diferença de oportunidades. Como Naércio Menezes destacou no artigo “A loteria da vida”, a realidade é que nascer pobre ou rico no Brasil faz uma diferença significativa, algo que não é tão acentuado em muitos outros países.

Diante desse cenário, muitos se perguntam: quais são as causas da desigualdade no Brasil? E qual o papel do liberalismo econômico nesse contexto?

Liberalismo Econômico e Desigualdade de Renda

Para alguns, o liberalismo econômico é visto como um dos responsáveis pela desigualdade de renda no Brasil, uma visão que associa políticas públicas voltadas à responsabilidade fiscal e ao respeito às liberdades individuais com o desprezo pelos mais pobres. No entanto, essa crítica ignora o que tem sido realmente praticado no país nas últimas décadas.

Durante o regime militar (1964-1985), por exemplo, o Brasil adotou um modelo econômico baseado em planos nacionais de desenvolvimento, com uma economia fechada e fortemente dependente de investimentos estatais. Isso está longe do que o liberalismo defende, pois um sistema verdadeiramente liberal promove uma economia aberta, com menor intervenção estatal.

Com a Constituição de 1988, o Brasil passou a assegurar diversos direitos sociais, estabelecendo um Estado responsável por garantir saúde, educação e bem-estar para todos. Com essa nova ordem, houve um aumento substancial nos gastos públicos e na carga tributária. Mesmo em governos de orientações distintas, essa estrutura de Estado continuou, com um setor público robusto e fortemente regulador dos mercados privados.

Por Que o Liberalismo Não É o Vilão?

Dizer que o liberalismo é responsável pela desigualdade no Brasil desconsidera o fato de que as políticas públicas implementadas até aqui estão muito distantes do que o pensamento liberal preconiza. O liberalismo, em sua essência, valoriza a competição justa e a meritocracia, onde os diferenciais de renda são uma recompensa ao esforço e ao talento.

Os liberais reconhecem que uma parte da desigualdade é natural e saudável em um sistema competitivo, onde o sucesso é fruto de mérito e esforço. Porém, o liberalismo também aponta que intervenções estatais desmedidas, que distorcem os incentivos econômicos, podem aumentar a desigualdade de forma indesejada. A concessão de privilégios fiscais e subsídios a grupos de interesse, por exemplo, acaba beneficiando aqueles que já possuem maior poder econômico.

O “capitalismo de compadrio”, conceito popularizado por Luigi Zingales em seu livro Capitalismo para o Povo, descreve bem a situação em que o Estado concede privilégios a grupos específicos, gerando uma concentração de renda que prejudica a sociedade como um todo. Para o liberalismo moderno, a luta contra a desigualdade passa pela eliminação desses privilégios, garantindo que o sucesso seja alcançado através do mérito e não de favores do Estado.

Liberalismo e Igualdade de Oportunidades

Uma visão moderna do liberalismo, como a de John Rawls em Uma Teoria da Justiça, sugere que a liberdade individual pode ser conciliada com a igualdade de oportunidades. Rawls propõe que, para que uma sociedade seja justa, ela deve buscar oferecer as mesmas oportunidades para todos, independentemente de sua condição de nascimento. Esse princípio liberal defende um Estado que assegure acesso igualitário à educação, saúde e segurança, permitindo que todos tenham a chance de desenvolver seu potencial.

A ideia é que, ao garantir igualdade mínima de oportunidades, o Estado possa promover uma competição mais justa, onde as desigualdades de renda reflitam apenas as diferentes habilidades e esforços dos indivíduos. Nesse modelo, as políticas públicas devem focar em reduzir a influência da “loteria da vida” e, assim, permitir que mais brasileiros possam alcançar uma vida digna através de seu próprio esforço.

Uma Agenda Liberal para a Redução da Desigualdade no Brasil

Para reduzir a desigualdade de forma consistente, é preciso reformular as políticas públicas adotadas no Brasil. Em vez de promover a igualdade, muitas dessas políticas acabam reforçando privilégios para aqueles que menos precisam. Em áreas como tributação, educação e saúde, o sistema muitas vezes beneficia os mais favorecidos, criando uma barreira para aqueles que estão em condições vulneráveis.

Uma agenda liberal de combate à desigualdade no Brasil passaria por algumas ações essenciais:

  1. Eliminação de Privilégios: Reduzir subsídios e incentivos fiscais que beneficiam grandes corporações e grupos econômicos poderosos. Essa prática distorce o mercado e cria uma concorrência injusta, que desestimula pequenos empreendedores e concentra a renda nas mãos de poucos.
  2. Igualdade de Oportunidades: Garantir que todos tenham acesso a educação e saúde de qualidade, independentemente de sua condição social. Esses são pilares fundamentais para que cada cidadão tenha a chance de alcançar seu potencial e para que a desigualdade de renda seja baseada apenas em mérito.
  3. Avaliação e Transparência: Implementar uma prática rigorosa de avaliação das políticas públicas, para que seja possível medir a eficiência dos programas de combate à desigualdade. O Brasil carece de um sistema que monitore o impacto dos investimentos em educação, saúde e outros serviços essenciais.
  4. Foco em Quem Mais Precisa: Direcionar recursos para os setores mais vulneráveis. Programas de habitação, acesso à educação e assistência social precisam priorizar aqueles que nasceram em condições desfavoráveis. Políticas públicas precisam ser desenhadas com foco nas necessidades de quem mais depende do suporte do Estado.

O Papel da Responsabilidade Fiscal no Combate à Desigualdade

Uma crítica comum ao liberalismo é que ele prioriza a responsabilidade fiscal em detrimento dos programas sociais. No entanto, a responsabilidade fiscal não deve ser vista como uma barreira, mas como um meio de garantir que os recursos sejam utilizados de forma eficiente. Evitar o desperdício de recursos públicos e equilibrar o orçamento é fundamental para que o Estado tenha a capacidade de financiar políticas de combate à desigualdade no longo prazo.

Se o Brasil não mantiver as finanças públicas sob controle, o risco é de que programas sociais se tornem insustentáveis, prejudicando justamente os mais pobres. Como discutido no artigo “A expansão fiscal que não podemos fazer”, o aumento desenfreado da dívida pública pode comprometer a capacidade de investimento do país e levar a uma crise fiscal.

O Brasil Precisa de um Liberalismo Inclusivo

A realidade do motoboy Mateus, que enfrentou a discriminação social e racial, é um reflexo de como o Brasil ainda privilegia aqueles que nascem em berços ricos. Para transformar essa realidade, é preciso adotar um modelo econômico que valorize a igualdade de oportunidades e promova a inclusão.

O liberalismo moderno oferece ferramentas para essa transformação. A redução da desigualdade no Brasil pode começar com o fim dos privilégios, a priorização das necessidades dos mais vulneráveis e o uso responsável dos recursos públicos. O objetivo é criar um ambiente onde todos, independentemente de sua origem, possam alcançar uma vida digna e prosperar com base no próprio esforço.

A desigualdade social no Brasil não é culpa do liberalismo econômico, mas sim de uma estrutura que perpetua privilégios e concentra poder. Um modelo econômico que valorize a igualdade de oportunidades, aliado a políticas públicas bem desenhadas e avaliadas, pode ser o caminho para um Brasil mais justo e inclusivo. É hora de parar de fazer a coisa errada e começar a investir em um futuro onde todos tenham as mesmas chances de sucesso, rompendo o ciclo da “loteria da vida” e construindo uma sociedade baseada no mérito e na justiça social.

Gastos Sociais e Dívida Pública: Como Equilibrar o Orçamento sem Comprometer o Futuro do Brasil?

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Durante um recente debate com os economistas Marcos Mendes, Laura Carvalho e Monica de Bolle, Armínio Fraga compartilhou um momento marcante de suas conversas com a equipe econômica de Nelson Mandela na África do Sul. O país, assim como o Brasil, enfrenta um cenário de enorme desigualdade social. Fraga lembrou que, ao assumir o Banco Central, ficou impressionado com a visão pragmática da equipe de Mandela, que era filiada ao Congresso Nacional Africano e comprometida com o desenvolvimento econômico e a justiça social. Segundo ele, a mensagem que ouviu foi clara: “Chegamos aqui cheios de sonhos, mas rapidamente percebemos que o melhor que podíamos fazer pelos mais pobres era evitar que o país quebrasse”.

No contexto da pandemia, o Brasil enfrentou uma necessidade inevitável de políticas compensatórias para mitigar os impactos da crise econômica. Com isso, estima-se que o déficit nominal de 2020 tenha ultrapassado os 15% do PIB, um nível sem precedentes na história recente. A grande questão que se coloca é: o Brasil gasta pouco com políticas sociais ou gasta mal? Essa reflexão é essencial para compreendermos como a relação entre gastos públicos e dívida impacta a capacidade do país de implementar políticas sociais sustentáveis.

Comparação dos Gastos Sociais do Brasil com Outras Economias

De acordo com estudos realizados pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) em 2018, e utilizando a metodologia da OCDE/ONU, o Brasil se destaca entre os países com altos gastos públicos. Com cerca de 33,7% do PIB direcionado para gastos governamentais, o Brasil está atrás apenas de países escandinavos, como Dinamarca, Finlândia, Noruega e Suécia. No entanto, enquanto esses países possuem renda per capita de 4 a 5 vezes maior e uma carga tributária elevada, o Brasil enfrenta um nível de renda inferior, o que gera uma grande pressão sobre o orçamento público.

Em termos de gastos com proteção social, o Brasil direciona aproximadamente 13% do PIB para aposentadorias e pensões, bem acima da média de 7,6% das economias emergentes e de 8,2% dos países desenvolvidos. Comparando com os países nórdicos, que investem cerca de 12,8% do PIB nessa área, o Brasil demonstra um esforço semelhante, mas sem contar com uma alta proporção de idosos na população. Enquanto, no Brasil, a população acima de 65 anos representa cerca de 14%, na Finlândia, por exemplo, esse número chega a 36%.

Educação: Um Gasto Acima da Média, mas Mal Alocado

O Brasil também apresenta um gasto elevado em educação. Segundo o estudo “Education at a Glance” da OCDE, publicado em 2019, o país investe 4,2% do PIB nessa área, valor superior à média da OCDE, de 3,2%. Esse dado pode soar positivo, mas a realidade se revela mais complexa ao analisar como esses recursos são distribuídos.

Nos ciclos iniciais de aprendizado, o Brasil gasta aproximadamente US$ 3,8 mil por aluno, enquanto a média dos países da OCDE é de US$ 8,7 mil. Embora o país esteja à frente de nações latino-americanas como Argentina, México e Colômbia, o valor investido ainda não é suficiente para garantir uma educação de qualidade.

Por outro lado, o investimento em ensino superior é desproporcionalmente alto. O Brasil gasta cerca de US$ 11,7 mil por aluno, valor próximo ao de países como Portugal, Estônia e Espanha. Embora o investimento em ensino superior seja fundamental, a falta de equilíbrio entre os gastos nos diferentes níveis de educação evidencia uma prioridade alocada de forma inadequada, o que contribui para a baixa qualidade da educação básica e para os maus resultados nas avaliações internacionais, como o teste do PISA.

Saúde: Gastos Relativamente Baixos e Distribuição Inadequada

No setor de saúde, o Brasil se posiciona em 64º lugar entre 183 países no ranking de despesas públicas, com aproximadamente 3,8% do PIB destinado a essa área, segundo relatório de 2018 do Tesouro Nacional e do Banco Mundial. Esse valor é próximo à média da América Latina, mas bem inferior ao que investem os países desenvolvidos, que destinam cerca de 6,5% do PIB à saúde, sobretudo devido à proporção mais alta de idosos em suas populações.

Embora o gasto com saúde esteja próximo ao de outros países da região, o Brasil ainda enfrenta desafios na qualidade e na cobertura do sistema público, o que demanda uma melhor alocação e utilização dos recursos para que a população tenha acesso a serviços essenciais.

Reflexões sobre o Déficit e o Cenário Futuro das Políticas Sociais

A partir de 2021, o Brasil enfrentará um desafio significativo ao tentar equilibrar a necessidade de políticas sociais com a capacidade de financiamento do Estado. Com uma relação dívida/PIB que se aproxima dos 100%, o país se depara com a possibilidade de duas alternativas para manter os gastos sociais em um nível elevado: aumentar a carga tributária ou elevar as taxas de juros.

Atualmente, a carga tributária do Brasil está em torno de 33% do PIB, um valor que já é elevado quando comparado com a média mundial e muito próximo dos 34% dos países mais ricos da OCDE. Um novo aumento nos impostos poderia desencorajar investimentos e impactar o crescimento econômico de um país que já vem registrando crescimento baixo há anos.

O Impacto da Dívida Pública sobre os Juros e o Custo Social

O cenário de descontrole fiscal poderia levar a um aumento das taxas de juros, o que elevaria os custos da dívida pública. Com uma dívida pública próxima de 100% do PIB, uma alta de apenas 1 ponto percentual nas taxas de juros representaria um acréscimo de cerca de R$ 73 bilhões ao gasto anual com juros, um valor quase 2,5 vezes maior do que o orçamento anual do Bolsa Família.

Se a taxa de juros subisse 4 pontos percentuais, o impacto seria ainda mais alarmante, equivalente a aproximadamente 10 anos de gastos com o Bolsa Família. O exemplo da Argentina, que chegou a taxas de juros de 80% em 2019, ilustra como um descontrole fiscal pode afetar a economia de um país e ampliar os custos para a população.

É essencial que o Congresso e o Governo Federal tomem decisões responsáveis quanto à ampliação de programas sociais. É importante que a sociedade saiba com clareza como esses gastos serão financiados no futuro. Caso contrário, o Brasil corre o risco de ver esses programas se tornarem insustentáveis.

Avaliação de Programas Sociais Existentes

Antes de expandir os programas sociais, seria prudente avaliar aqueles já em execução. Há indícios claros de que o país gasta mal em várias áreas, como aposentadorias, pensões e educação. O Brasil gasta significativamente em políticas sociais, mas a ineficiência na alocação desses recursos compromete o alcance dos resultados desejados. A questão não é apenas a quantidade de recursos, mas também a qualidade do gasto.

Evitar que o Brasil enfrente uma crise fiscal e financeira deve ser uma prioridade. Em tempos de incerteza, o país precisa manter uma trajetória sustentável de dívida pública para garantir que os recursos estejam disponíveis para os mais vulneráveis no longo prazo. A estabilidade econômica, nesse contexto, pode ser a política social mais importante para os próximos anos, pois é ela que permitirá que o Brasil continue investindo em programas sociais, educação e saúde de forma sustentável.

Privilégios e Desigualdade no Brasil: Como o Sistema Alimenta a Concentração de Renda

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No Brasil, o debate sobre privilégios sempre se intensifica quando se critica um grupo específico de beneficiários. Defensores de benefícios fiscais ou vantagens tributárias, por exemplo, costumam responder a críticas apontando para outros privilégios que também deveriam ser combatidos. Isso cria um ciclo no qual vários privilégios se perpetuam, sustentando um dos países mais desiguais do mundo.

Essa realidade é confirmada pelo Relatório de Desenvolvimento Humano da ONU, divulgado em dezembro de 2019, que aponta o Brasil como a segunda maior concentração de renda mundial, ficando atrás apenas do Catar no quesito concentração de renda do 1% mais rico. Quando analisado o coeficiente de Gini, índice que mede a desigualdade, o Brasil ocupa a sétima posição global, perdendo apenas para alguns países africanos.

O Abismo entre Setor Público e Privado

No artigo “O oásis do funcionalismo público no Brasil”, explorei as diferenças salariais entre trabalhadores do setor público e privado. Na média, os servidores públicos brasileiros ganham significativamente mais do que seus colegas do setor privado, e muitos deles possuem estabilidade no emprego, o que raramente ocorre na iniciativa privada. Em tempos de crise, em que a maioria dos trabalhadores sofre com cortes salariais e aumento do custo de vida, os salários mais altos do funcionalismo permanecem irredutíveis, gerando descontentamento social.

Parte das críticas ao meu artigo veio de servidores públicos, que apontaram para privilégios do setor privado, como benefícios fiscais. Sim, existem, mas uma injustiça não justifica outra. Esse comportamento, de tentar desviar a atenção para outro grupo, é recorrente em várias esferas: empresários, funcionários públicos e demais setores privilegiam seus interesses, defendendo os próprios benefícios enquanto criticam os de outros.

Exemplos de Privilégios Fiscais e Tributários

O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos do mundo e cheio de brechas. A “pejotização”, por exemplo, permite que profissionais liberais paguem menos impostos ao prestarem serviços como pessoa jurídica, enquanto um trabalhador com o mesmo salário paga praticamente o dobro em tributos ao ser registrado como pessoa física.

Outro exemplo é o benefício fiscal para empresas localizadas na Zona Franca de Manaus, que deixam de recolher impostos que competidores em outros estados são obrigados a pagar. Isso cria uma concorrência desleal, em que alguns conseguem manter preços menores sem necessariamente serem mais produtivos ou eficientes.

O sistema tributário brasileiro é notoriamente complexo e, muitas vezes, injusto. Existem mais de 100 regimes especiais de PIS e Cofins, além de diversas isenções e deduções que variam por setor e localização. Essas variações criam uma verdadeira “colcha de retalhos” que beneficia poucos em detrimento de muitos, com grande custo para a população que arca com uma carga tributária elevada.

A situação é agravada pela inclusão de produtos como salmão defumado na lista de itens isentos de tributos na cesta básica, um item que não faz parte da realidade alimentar da maioria dos brasileiros. Isso revela as distorções e desigualdades do sistema tributário, que muitas vezes beneficia os mais ricos sob o pretexto de favorecer os pobres.

O Sistema Educacional: Um Reflexo da Desigualdade

A educação é um dos principais fatores de desigualdade no Brasil. Segundo o último Censo Escolar do INEP, 80% das matrículas escolares estão na rede pública, que enfrenta falta de recursos, infraestrutura inadequada e, muitas vezes, baixa qualidade de ensino. Em contrapartida, escolas particulares de alto padrão oferecem uma educação de qualidade, mas a maioria da população não pode pagar por elas.

Além disso, o sistema de ensino superior público beneficia, em grande parte, jovens de famílias ricas, que tiveram acesso a boas escolas particulares e conseguem competir pelas vagas mais disputadas em universidades públicas. Enquanto isso, estudantes da rede pública enfrentam enormes barreiras para alcançar as mesmas oportunidades, perpetuando um ciclo de desigualdade.

A Proteção ao Mercado e o Impacto no Consumo

O Brasil é um dos países mais fechados ao comércio internacional. Muitos setores defendem barreiras de proteção, mas isso encarece produtos e limita a qualidade dos bens consumidos pela população. Esse protecionismo, em teoria, visa estimular a indústria nacional, mas, na prática, gera produtos mais caros e de menor qualidade para os consumidores. A Lei de Proteção à Informática, de 1984, é um exemplo: ela limitava a entrada de produtos estrangeiros para favorecer o desenvolvimento local, mas acabou resultando em preços altos e tecnologias defasadas.

Benefícios para Grandes Empresas e o Pequeno Empreendedor

Até pouco tempo atrás, empresas escolhidas como “campeãs nacionais” podiam obter financiamento do BNDES com taxas de juros subsidiadas, custeadas pelo Tesouro Nacional. Pequenos empreendedores, por outro lado, precisavam recorrer a linhas de crédito com taxas de juros muito superiores. Essa política privilegiava empresas grandes e estabelecidas, enquanto limitava o crescimento de pequenas e médias empresas.

Exemplos como esses mostram que o Estado brasileiro, muitas vezes, beneficia poucos em detrimento da maioria. Para que haja uma redução nas desigualdades, é essencial mudar a forma como o Estado intervém, promovendo igualdade de oportunidades e corrigindo privilégios que concentram renda.

O Fenômeno da Captura do Estado

O conceito de captura do Estado refere-se ao processo em que grupos de interesse usam sua influência para obter benefícios do governo, uma prática conhecida como “rent-seeking”. Esse fenômeno foi descrito por economistas como Gordon Tullock e Anne Krueger, e ocorre quando grupos poderosos influenciam decisões do governo para obter privilégios e vantagens.

Quanto maior o poder de um grupo de interesse, mais renda ele consegue desviar para si, desviando-se da competição justa no mercado. Isso cria um ciclo vicioso em que empresas e indivíduos dedicam mais esforços para garantir benefícios junto ao Estado do que para melhorar a eficiência e produtividade. Para evitar esse tipo de captura, é fundamental que o governo estabeleça regras claras que garantam que todos sejam tratados de maneira igual.

Capitalismo para Todos: Uma Proposta de Igualdade

O economista Luigi Zingales, no livro “A Capitalism for the People”, argumenta que o capitalismo deve funcionar para todos, e não apenas para uma elite. Ele aponta que práticas de lobby e pressões corporativas sufocam a competitividade e a mobilidade social, o que, segundo ele, coloca em risco o ideal de uma economia voltada ao bem-estar geral.

No Brasil, para que o capitalismo funcione de forma mais equitativa, o Estado deve adotar o princípio de tratar os iguais de maneira igual. Isso implica que as oportunidades devem estar acessíveis a todos, independentemente de condições econômicas ou status social, e que os ganhos financeiros resultem do talento e do esforço, e não de favores e privilégios.

Caminhos para um Brasil Mais Justo

Para reduzir a concentração de renda no Brasil, é essencial que o Estado promova igualdade de oportunidades desde a infância, garantindo acesso à educação, saúde e segurança. Essas condições são fundamentais para a mobilidade social e para que o mérito e o esforço pessoal sejam os principais determinantes do sucesso individual.

No entanto, no Brasil, a desigualdade estrutural persiste. Crianças de famílias pobres muitas vezes crescem sem saneamento básico e estudam em escolas de baixa qualidade, enquanto empresas e corporações poderosas beneficiam-se de privilégios garantidos pelo Estado. Esse ciclo perpetua uma concentração de renda que exclui a maioria da população.

Um Choque de Integridade

Como mencionado pelo ministro Luís Roberto Barroso, o Brasil precisa de um “choque de integridade”. Essa transformação passa não apenas pela mudança nas instituições e nas leis, mas por uma renovação na mentalidade da sociedade, que valorize a honestidade e a transparência. É preciso que o Brasil evolua para um sistema no qual o mérito seja o principal critério para o sucesso e onde o Estado seja imparcial, oferecendo as mesmas oportunidades a todos.

O Brasil precisa de uma nova ética pública que valorize a integridade e combata a corrupção, para que as futuras gerações cresçam em um país onde o esforço e o talento sejam os maiores fatores de sucesso. O caminho é longo, mas, com mudanças estruturais e um compromisso com a igualdade de oportunidades, o país pode avançar rumo a um futuro mais justo e igualitário.