A Queda da Democracia na Tunísia: Entre Esperança e Desilusão
A Tunísia, que um dia brilhou como uma história de sucesso no contexto do Oriente Médio e Norte da África, atravessa um momento sombrio. Enquanto muitos países árabes experimentaram agitações massivas em 2011, a Tunísia não cedeu imediatamente ao autoritarismo ou ao caos civil. Após a destituição de seu longo ditador, a nação viu uma transição democrática, com eleições livres e o surgimento de uma constituição progressista, que fortaleceu a sociedade civil e os meios de comunicação.
O Retorno ao Autoritarismo
Recentemente, no entanto, a Tunísia experimentou um retrocesso alarmante. No último mês, ocorreu uma eleição presidencial simulada, a primeira em 14 anos, e claramente manipulada. O atual presidente, Kais Saied, declarou ter obtido 90% dos votos, em um ambiente marcado pela repressão e pela ausência de alternativas reais. Os protestos contra sua administração fizeram renascer a esperança de que a democracia pudesse ser resgatada.
Embora tenhamos um contexto de desilusão, o colapso da democracia tunisiana não ocorreu da noite para o dia. Ele se desenrolou ao longo dos últimos anos, e muitos dos problemas enfrentados pela Tunísia são, ironicamente, consequência de seus êxitos iniciais. O que levou à Primavera Árabe, como a disposição dos líderes em compartilhar o poder, acabou gerando uma paralisia governamental, incapaz de realizar reformas que pudessem combater o crescente descontentamento popular.
O Impacto da Fragilidade Política
Kais Saied, um jurista que chegou ao poder em 2019, rapidamente centralizou sua autoridade. Dissolveu o parlamento, suspendeu a constituição e prendeu opositores. Em 2022, afirmamos no Foreign Affairs que o modelo de transição democrática da Tunísia estava "às portas da morte", e que somente com apoio externo seria possível revitalizá-lo. Infelizmente, esse suporte nunca se concretizou na escala necessária.
Sem assistência, os defensores da democracia na Tunísia enfrentaram uma repressão crescente e não conseguiram motivar a população cansada a lutar novamente pela democracia. O anseio por mudanças esta mais vivo do que nunca, mas se há algum caminho para resgatar a situação atual, isso requer reconstruir a confiança pública na democracia e a crença de que ela pode proporcionar estabilidade e crescimento econômico.
A Luta por um Futuro Melhor
Um dos grandes trunfos da Tunísia na última década foi a presença de uma sociedade civil robusta e lideranças abertas ao diálogo. O modelo de consenso que permitiu à nação sair da ditadura rapidamente se tornou um obstáculo à governabilidade. A Constituição de 2014, que visava impedir a concentração de poder, acabou por dificultar a implementação de reformas necessárias para enfrentar problemas como o desemprego juvenil e a inflação crescente.
Saied inicialmente se posicionou como um salvador em tempos de crise. No entanto, seus esforços para contornar as leis estabelecidas trouxeram frustração ao povo, que começou a vê-lo como mais um representante da corrupção. A realização de um referendo em 2022, feito para assegurar suas práticas não convencionais, foi um passo que contribuiu para aumentar o descontentamento. A baixa participação, com apenas 28% do eleitorado comparecendo, revela a apatia que tomou conta dos tunisianos.
Situação Atual e Repressão
O cenário atual é alarmante. A repressão de Saied não só é brutal, mas também caótica. Sem afiliado a nenhum partido, ele toma decisões de forma arbitrária – demitindo ministros e substituindo governadores sem explicações. O resultado é um governo que opera com pouca transparência e cuja eficácia é continuamente comprometida.
Os dados sobre a economia refletem a gravidade da situação: a taxa de desemprego atinge 16%, com números ainda maiores entre mulheres e jovens. A luta contra a corrupção e a desigualdade, antigas chagas da sociedade tunisiana, continua sem os devidos esforços. Essa frustração fez com que muitos tunisianos voltem a olhar para a migração como uma solução mais viável para suas vidas.
O Papel da Sociedade Civil e a Esperança para o Futuro
Apesar do cenário desolador, ainda existem vozes de resistência. O líder do sindicato mais influente da Tunísia, Noureddine Taboubi, tem se mostrado cada vez mais crítico ao regime de Saied, e há sinalizações de que a insatisfação popular pode se intensificar. Multiplicam-se também as manifestações contra o governo, com cidadãos clamando por um retorno aos ideais democráticos.
Embora haja muitos desafios, a constituição de Saied limita seu mandato a dois períodos, criando uma janela de oportunidade para que novas lideranças reinventem a política tunisiana. Ativistas pró-democracia, mesmo em exílio, ainda têm um papel crucial a desempenhar na formação de novos movimentos que possam abordar as crescentes desigualdades sociais e a corrupção.
Uma Última Chance para a Democracia Tunisiana
O apoio internacional pode ser um componente crucial nesse processo. Para revitalizar as vozes democráticas, os governos ocidentais precisam se posicionar contra a repressão de Saied e ressaltar a importância de acompanhar de perto a situação política. Cada atitude conta: desde condenar publicamente abusos até financiar iniciativas de direitos humanos, passando pelo engajamento com a sociedade civil.
É um momento inaugural para a Tunísia, que pode redefinir seu futuro. Apesar do autoritarismo em vigor, a chama da esperança ainda arde nos corações dos tunisianos. Eles podem e devem lutar por um futuro melhor, onde a democracia não seja apenas um ideal, mas uma realidade conquistada, mesmo diante das adversidades.
A luta pela democracia na Tunísia é uma jornada que demanda coragem, unidade e apoio. Cada cidadão tunisiano e cada aliado internacional têm um papel essencial a desempenhar. Que a voz do povo ecoe novamente, e que a Tunísia encontre seu caminho de volta à liberdade e à justiça. O futuro da democracia tunisiana não está perdido, mas depende da ação coletiva e da resiliência de seu povo.