
Recentemente, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq-USP) divulgaram um relatório que traz um panorama detalhado da cadeia produtiva da soja e do biodiesel. Em 2024, a realidade se apresentou desafiadora, com uma redução de 5% no volume e 3,27% na receita dessa cadeia, motivada pela quebra de produção resultante de condições climáticas adversas e pela volatilidade nos preços internacionais.
Apesar dessa queda, o setor movimentou impressionantes R$ 650 bilhões e continua a desempenhar um papel fundamental na economia brasileira, correspondendo a 5,5% do PIB nacional e 24% do PIB do agronegócio.
De acordo com Daniel Amaral, economista-chefe da Abiove, o Brasil alcançou um marco histórico ao exportar mais de 108 milhões de toneladas de soja. Porém, é essencial avançar na industrialização desse produto: “Atualmente, apenas um terço da produção é processado internamente. Se conseguirmos aumentar essa proporção, a geração de renda e emprego será significativamente afetada”, afirmou.
Nicole Remelgado Castro, pesquisadora do Cepea, complementou que, apesar da diminuição registrada em 2024, a cadeia ainda opera em níveis superiores aos observados antes da pandemia. “Desde os picos de 2021, com a alta dos preços internacionais, enfrentamos três anos consecutivos de queda na renda real, mas o volume total em 2024 foi o segundo maior da história”, explicou.
O Papel da Agroindústria na Recuperação
A agroindústria teve um papel crucial em suavizar os efeitos negativos da quebra de safra, especialmente nas áreas de esmagamento, refino e produção de biodiesel. “Mesmo com menos produção agrícola, o aumento do processamento interno ajudou a minimizar a retração do PIB da cadeia”, destacou Nicole.
Impacto da Industrialização na Soja
Um dos pontos mais relevantes do estudo é o impacto econômico da industrialização. Cada tonelada de soja processada gera R$ 6.370 em PIB, enquanto a soja apenas plantada e exportada gera somente R$ 1.738. Isso significa que o processamento interno multiplica o valor agregado em 4,67 vezes.
No mercado de trabalho, esses números também se refletem. Em 2024, a cadeia da soja empregou 2,26 milhões de pessoas, embora tenha havido uma diminuição de 3,2% no total comparado ao ano anterior. Contudo, a indústria conseguiu parcialmente compensar essa redução, especialmente nas atividades pós-colheita, com um crescimento superior a 20% nas contratações em setores como esmagamento e produção de rações.
Rodrigo Peixoto da Silva, pesquisador do Cepea, comentou: “O processamento gera 4,39 vezes mais empregos por tonelada do que a simples produção e exportação do grão”.
Números das Exportações e Desafios Futuros
As exportações da cadeia produtiva de soja e biodiesel alcançaram US$ 54,25 bilhões em 2024, apresentando uma redução de 19,7% em valor e 2,5% em volume. Essa queda foi influenciada pela diminuição dos preços internacionais e pela produção nacional mais baixa. A soja in natura representou 79% das exportações, com a China absorvendo 73% desse total. Fernanda Szygański-Lespinski, economista do Cepea, destacou que o único subproduto com desempenho positivo foi o glicerol, enquanto todos os outros produtos enfrentaram retração tanto em valor quanto em preço.
De acordo com especialistas do Cepea, o cenário global continua incerto, marcado por disputas comerciais e a possibilidade de novas tarifas. Amaral comentou sobre a situação atual: “Ainda é difícil quantificar o impacto total das tensões comerciais, mas o Brasil pode se beneficiar como fornecedor estratégico”. Ele também expressou otimismo em relação ao aumento das exportações, especialmente rumo à China e Europa, mas ressaltou as pressões que podem surgir sobre as margens da indústria. “Sem políticas industriais estáveis e previsíveis, a capacidade de processamento pode ser comprometida, o que afetaria o fornecimento de farelo para a cadeia de proteína animal”, alertou.
À medida que olhamos para o futuro, é fundamental considerar como a industrialização e a gestão eficaz da cadeia produtiva da soja podem moldar o cenário econômico do Brasil. A capacidade de transformar matérias-primas em produtos de maior valor agregado não apenas impulsiona a economia, mas também gera oportunidades de emprego e desenvolvimento regional.
O potencial do Brasil como um gigante no mercado de soja é inegável, e a inovação na indústria será a chave para garantir que consigamos não só atender à demanda externa, mas também fortalecer nossa posição no mercado global. É um trabalho que exige colaboração entre governo, indústria e academia para encontrar soluções sustentáveis e rentáveis.
Assim, o futuro da soja no Brasil não se resume apenas a cifras, mas a um compromisso coletivo com a qualidade, a sustentabilidade e a valorização do trabalho. Que possamos juntos trilhar um caminho de crescimento e prosperidade, celebrando não apenas nossos números, mas a transformação que eles representam.