Desafios e Mudanças na Gestão de Imóveis da União em 2024
Em 2024, a venda de imóveis da União passou por um drástico declínio. Os leilões realizados para transferir prédios e terrenos públicos arrecadaram apenas R$ 5,7 milhões, um impressionante recuo de 88,5% em relação a 2023 e uma queda de 98% comparado a 2022, quando a arrecadação alcançou R$ 374,5 milhões. O número de unidades vendidas também foi alarmante: em 2022 ocorreram 113 vendas, seguidas por 28 em 2023 e, finalmente, apenas nove em 2024.
Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgado em fevereiro do ano passado, destacou que a Secretaria de Patrimônio Público (SPU) enfrenta uma estrutura insuficiente para gerenciar o vasto patrimônio imobiliário federal, que conta com 764 mil imóveis. Dentre eles, apenas 49,7 mil estão ativos, enquanto a maioria é cedida para diferentes fins, com a possibilidade de cobrança de taxas mensais ou anuais.
No registro do TCU, há uma oportunidade significativa de geração de receita com a venda imediata de 2.487 imóveis vagos e 342 invadidos. Essa venda gerou entusiasmo no governo anterior, sendo que o ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a afirmar que o valor total do patrimônio poderia atingir até R$ 1 trilhão. Durante o governo Bolsonaro, entre 2019 e 2022, foram vendidos 308 imóveis, trazendo uma arrecadação de R$ 833,6 milhões, uma média anual de R$ 208,4 milhões, o que representa um aumento de 125% em relação aos valores de 2018, último ano do governo de Michel Temer (MDB).
Os imóveis da União são variados, abrangendo desde edifícios e terrenos até ilhas e corpos d’água, cada um com suas características e possíveis usos. Dentre o total, 229 mil são ilhas.
A Complexidade na Gestão dos Imóveis Públicos
A gestão dos imóveis, embora centralizada na SPU, envolve diversos órgãos do governo, incluindo o Exército, o Ministério das Cidades, o Incra, a Caixa Econômica Federal e universidades, o que torna o processo bastante complexo.
Com a mudança na presidência no início de 2023, com o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva, houve uma alteração na abordagem em relação às vendas de imóveis. Em fevereiro passado, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) anunciou o programa “Imóvel da Gente”, que visa ceder ou vender mil imóveis até 2026, com foco em políticas habitacionais.
A Crítica à Gestão Anterior
A ministra da Gestão, Esther Dweck, mencionou que a abordagem de venda de imóveis no governo anterior se mostrou ineficaz. Alguns leilões não atraíram o interesse do setor privado, resultando em vendas que ocorreram por valores que estavam abaixo do mercado, como R$ 50 mil, R$ 30 mil e até R$ 5 mil.
Um relatório do TCU emitido em novembro de 2021 corroborou essa avaliação, apontando a baixa efetividade da estratégia de vendas adotada. Entre 243 imóveis oferecidos entre 2020 e 2021, apenas 65 foram vendidos, resultando em uma taxa de sucesso de apenas 27%. O total dos imóveis oferecidos representava R$ 1,34 bilhão, enquanto os vendidos somaram cerca de R$ 119 milhões.
Um Novo Olhar para o Patrimônio Público
O governo atual, em resposta a críticas, afirma que a mudança de perspectiva sobre o patrimônio é fundamental. De acordo com o Ministério da Gestão, a antiga estratégia de venda muitas vezes não refletia o valor real dos imóveis. “O Imóvel da Gente inverte essa lógica, valorizando o patrimônio público e garantindo uma destinação socioambiental”, destacou Dweck.
No primeiro balanço do “Imóvel da Gente”, o MGI reportou que, nos 22 meses iniciais de gestão, houve 625 transferências, sendo 294 apenas em 2023 e 331 entre janeiro e outubro de 2024. A meta permanece de mil transferências até 2026, restando, portanto, 375 para atingir o objetivo. A expectativa do governo é de que 400 mil famílias sejam beneficiadas por meio desses imóveis.
O Desafio dos Imóveis Ociosos
Apesar das metas projetadas, a distância entre os objetivos e a realidade é alarmante. O TCU apontou 2.829 endereços com potencial imediato para transferência que ainda não foram utilizados. Além disso, o número de imóveis ociosos pode ser ainda maior. Somente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), há 3.213 propriedades não operacionais, das quais 483 já foram classificadas pelo governo como prontas para transferência via programa “Imóvel da Gente”.
Uma Gestão Patrimonial em Números
O valor estimado dos imóveis administrados pela SPU chega a impressionantes R$ 1,77 trilhão. Entretanto, o TCU alerta para a desatualização e falta de confiabilidade dos dados dos registros. O relator do estudo, ministro Jhonatan de Jesus, ressaltou que isso impede uma visão clara do portfólio de bens da União, dificultando o planejamento estratégico da Secretaria.
O sistema de informações da SPU, que deveria estar completo desde 2015, ainda não está totalmente operacional, com apenas metade dos módulos previstos desenvolvidos e um custo de R$ 11 milhões. Isso resulta em uma gestão ineficiente, embora haja um potencial significativo de gerar ganhos para a União e preservar o patrimônio de forma sustentável.
Além disso, o TCU destaca a necessidade urgente de reavaliação dos imóveis. “Mais de 650 mil imóveis da União são designados para ocupação e aforamento, com a arrecadação baseada em percentuais definidos em lei. Assim, um esforço de reavaliação se mostra essencial para garantir a devolutiva ao erário”, mencionou o relatório.
A Arrecadação e a Realidade do Patrimônio
Apesar da queda nas vendas, a receita total da SPU com aluguéis e outros tipos de cobranças se mantém estável desde 2016, após correção pela inflação. Essa estabilidade, no entanto, não reflete a situação crescente do número de imóveis da União, que aumentou de 742 mil para 764 mil, segundo dados mais recentes do TCU.
Esse panorama evidencia não apenas os desafios enfrentados pela gestão de imóveis da União, mas também a necessidade de uma abordagem mais inteligente e consciente na administração do patrimônio público. À medida que o governo busca novas soluções para os imóveis ociosos, é importante que a população acompanhe e participe do debate sobre um tema tão crucial para o desenvolvimento urbano e social do país.