O Surgimento das “Neoclouds”: A Nova Era da Infraestrutura de IA
Em 2014, David Aninowsky, o fundador da Vultr, começou a implementar seus próprios data centers. Naquela época, a principal preocupação de seus clientes era a computação em nuvem e os processadores que a sustentavam. As unidades de processamento gráfico (GPUs) eram quase um assunto exclusivo de gamers, afastadas das discussões empresariais. No entanto, a crescente relevância da inteligência artificial (IA) mudou completamente esse cenário, transformando essas GPUs em componentes cruciais. Agora, a Vultr se destaca neste novo mercado, alcançando uma avaliação impressionante de US$ 3,5 bilhões.
Recentemente, a startup da Flórida garantiu US$ 333 milhões em financiamento de importantes investidores, incluindo a gigante de chips AMD e o fundo de hedge LuminArx Capital. Ao longo da última década, a Vultr construiu mais de 30 data centers pelo mundo, oferecendo serviços de hospedagem altamente sofisticados que costumavam ser dominados por gigantes como AWS, Google Cloud e Microsoft Azure. O aluguel de GPUs se tornou o motor principal desse crescimento. “A IA é a área que mais cresce no mercado de infraestrutura”, afirma JJ Kardwell, CEO da Vultr, em entrevista à Forbes.
Crescimento Espetacular: O Interesse dos Investidores
Não é apenas a Vultr que está surfando nesta onda. Nos últimos 12 meses, investidores injetaram cerca de US$ 20 bilhões em 25 empresas que oferecem acesso a GPUs. Essa quantia inclui US$ 8 bilhões em capital próprio e mais de US$ 12 bilhões em dívidas, principalmente através de empréstimos de grandes instituições financeiras como Black Rock, Carlyle e Pimco.
Esse crescimento explosivo gerou um novo jargão no mercado, mas muitos ainda não definiram uma terminologia clara para esse setor em ascensão. Termos como “GPUs na nuvem” ou “Fábricas de GPUs” estão em discussão, mas Dylan Patel, analista da SemiAnalyses, prefere um conceito mais abrangente: as “Neoclouds”. “Novos gigantes estão surgindo neste novo cenário”, observa Patel.
Coreweave: O Líder Emergente
Entre as novas estrelas do setor, destaca-se a Coreweave. Com origens na mineração de criptomoedas, a startup de Nova Jersey rapidamente transformou sua armada de GPUs em uma fonte de aluguel para startups que desenvolvem IA após a queda do mercado em 2018. Em um ano, a empresa levantou US$ 1,75 bilhão em capital próprio e US$ 8,1 bilhões em dívidas, atingindo uma avaliação de US$ 23 bilhões.
Além da Coreweave, o panorama inclui diversas startups “refugiadas” do espaço das criptomoedas. A Crusoe Energy, por exemplo, iniciou suas operações minerando bitcoin utilizando gás queimado da extração de petróleo, enquanto a mineradora alemã Dados do Norte recebeu um resgate de US$ 1,1 bilhão de uma empresa de stablecoins para se reinventar como um gigante da computação para IA.
A Revolução das Startups Tradicionais
O setor também é preenchido por empresas de data centers mais tradicionais. Organizações como a Vultr e a francesa OVH mudaram o foco de computação em nuvem para infraestrutura de IA. Outros exemplos incluem a Eu não vou, que, surgindo das cinzas da Yandex (conhecido como o “Google da Rússia”), conseguiu levantar US$ 700 milhões em uma colocação privada para impulsionar serviços de aluguel de GPUs. A demanda de empresas menores, como a Runpod, que conecta clusters de chips Nvidia, e a Pilha Fluida, que oferece data centers ociosos, também está em alta.
Como o Modelo de Negócio Atrai Investidores
Atraídos pela rentabilidade do aluguel de GPUs, os investidores estão dispostos a fechar os olhos para as histórias de origem inusitadas dessas startups visionárias. Historicamente, o retorno sobre o investimento (ROI) em uma GPU era de seis meses; hoje, esse período se estendeu para vários anos. Patel explica que o grande diferencial é a escalabilidade.
Benefícios Competitivos e Desafios no Setor
O crescimento das “neoclouds” se deve, em parte, à escassez de chips de IA e suas tarifas significativamente mais baixas quando comparadas a empresas como AWS e Oracle. A Coreweave, por exemplo, oferece acesso a chips de IA, como o Nvidia A100, a um custo de US$ 2,21 por hora, enquanto AWS cobra US$ 5,12 pelo mesmo serviço. Embora a AWS ofereça descontos para reservas de longo prazo, as “neoclouds” se aproveitam de uma estrutura de preço mais flexible, vendendo GPUs “bare metal”, ou seja, sem a integração de software.
As startups que atuam nesse novo paradigma também têm uma vantagem significativa ao conseguir acesso a GPUs. A Nvidia está investindo na Coreweave e na Applied Digital, enquanto a concorrente AMD tem fortalecido sua parceria com a Vultr. Como resultado, gigantes da tecnologia como Microsoft e Oracle se tornaram alguns dos maiores clientes das “neoclouds”. A Microsoft, por exemplo, alertou sobre “restrições de capacidade” em seus data centers e recorreu à Coreweave para atender à demanda em crescimento.
O Futuro das Neoclouds: O Que Esperar?
Embora as “neoclouds” tenham um grande potencial, elas também enfrentam desafios significativos. A captação de recursos continua a ser um obstáculo, assim como a construção e a operação de data centers. Para muitas equipes menores com experiência em mineração de bitcoin, gerenciar GPUs e dados sensíveis é um desafio complexo. “Administrar um data center é radicalmente diferente de operar um armazém industrial”, alerta Chase Lochmiller, CEO da Crusoe Energy.
A demanda por chips de IA parece estar diminuindo, levando algumas startups a reduzirem os preços em até 33% nos últimos meses. Com novas versões de chips Nvidia sendo lançadas, as empresas mais estabelecidas dentro desse mercado podem sair na frente, colocando em risco a sobrevida dos pequenos players. “Acredito que uma boa parte dessas neoclouds acabará fracassando”, conclui Patel.
À medida que o setor evolui, permanece a expectativa sobre como essas startups poderão se adaptar e prosperar. O mercado de tecnologia é notoriamente imprevisível, e o sucesso muitas vezes depende da capacidade de inovação e flexibilidade das empresas. Quais serão as próximas etapas que essas neoclouds darão? E como elas moldarão o futuro da Inteligência Artificial?