A Crise Política na Geórgia: Entre Sonhos de Liberdade e a Sombra da Autoritarismo
No coração de Tbilisi, em uma noite fria de dezembro, um mar de pessoas se aglomerava diante do prédio do Parlamento da Geórgia. Entre elas estava Nika Khotchdava, um jovem disc jockey de 28 anos e gerente do famoso clube Left Bank. Com um semblante decidido, Nika compartilhou suas inquietações sobre o futuro do seu país. A multidão, predominantemente composta por jovens com idade entre 20 e 30 anos, protestava contra a decisão do partido governante, o Georgian Dream, de suspender as negociações de adesão à União Europeia (UE). Essa medida veio na esteira de uma eleição nacional em outubro, amplamente considerada fraudada, que deixou a Geórgia à beira de um colapso democrático.
A Última Oportunidade para a Liberdade
Nika expressou a urgência que muitos georgianos sentem: “Esta é nossa última chance.” O temor de que o país se inserisse sob a "batuta da Rússia" estava palpável. Atrás dele, uma projeção nas paredes do Parlamento clamava: “EUA e UE. O povo georgiano pede que vocês apliquem sanções a Bidzina Ivanishvili e ao governo ilegítimo.” O ambiente estava carregado, com um confronto crescente entre manifestantes e forças policiais que havia resultando em mais de 400 detenções e inúmeros feridos. Para um país pequeno como a Geórgia, esse número representa um choque imenso.
Esse descontentamento havia se espalhado a várias partes do país, gerando ondas de protestos contra o governo. Durante minhas conversas com representantes de partidos de oposição, organizações civis, diplomatas e especialistas regionais, muitos jovens ainda exibiam marcas visíveis de brutalidade policial, comentando como tinham sido detidos durante protestos pacíficos. Uma era de desconfiança e desilusão prevalece, onde muitos veem a Geórgia à beira de se tornar uma ditadura de partido único—a dura realidade para um país que, há apenas duas décadas, era elogiado pelo então presidente dos EUA, George W. Bush, como um “farol de liberdade”.
A Reação do Ocidente e o Isolamento da Geórgia
Comprovadamente, as eleições de outubro foram manipuladas. No entanto, a resposta da comunidade internacional foi estranhamente apática. Em seu relatório preliminar, a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) elogiou a condução das eleições pelos oficiais georgianos, mencionando apenas algumas irregularidades. As autoridades europeias afirmaram que “o engajamento demonstrado no dia das eleições” era um sinal de que o sistema democrático estava em evolução. Essa falta de ação contrasta dramaticamente com a fúria das lideranças autoritárias, que aplaudiram o resultado das eleições. O governo chinês, por exemplo, elogiou a realização de "uma eleição parlamentar tranquila".
Causas da Virada Autocrática
Vários fatores internos contribuíram para essa guinada autoritária. O crescimento do Georgian Dream, que serve como um veículo para as ambições políticas do bilionário Bidzina Ivanishvili, é central para entender essa transformação. Desde que assumiu o poder em 2012, o partido tem seguido um caminho que se aproxima cada vez mais do autoritarismo. Os países ocidentais, antes enrolados em apoiar a democracia georgiana, agora observam com os braços cruzados enquanto o partido consolida seu poder.
Os interesses russos também desempenham um papel crítico nessa trama. Com histórico de ver a região do Cáucaso do Sul como parte do seu quintal estratégico, a Rússia busca impedir que países como Geórgia, Moldávia e Ucrânia floresçam como exemplos de democracia liberal, um temor que se intensificou após a descoberta dos ricos campos de hidrocarbonetos na Ásia Central.
O Sonho Europeu em Perigo
A Geórgia, com sua população de 3,7 milhões, sempre foi vista como um raro exemplo de democracia em uma região tumultuada. Há anos, os georgianos manifestam seu desejo de estreitar laços com o Ocidente, e em dezembro de 2023, a UE declarou oficialmente a Geórgia como candidata a membro. Entretanto, a realização desse sonho agora parece distante.
Nas eleições de outubro, o Georgian Dream proclamou uma vitória fácil, garantindo 53,9% dos votos, o que lhe assegurou controle sobre o parlamento. Apesar de alguns partidos de oposição terem conseguido superar a barreira de 5% para se integrar no novo parlamento, a fragmentação interna da oposição favoreceu a continuidade do partido no poder.
Evidências da Manipulação Eleitoral
A manipulação eleitoral não é apenas um boato—há evidências claras de compra de votos e intimidação de monitores eleitorais. Pesquisas independentes indicavam que o apoio ao Georgian Dream estava na faixa de 40%, muito abaixo dos números oficiais. Até mesmo as pesquisas de saída no dia da eleição não condiziam com os resultados finais.
A influência de Putin paira sobre o Georgian Dream. Ivanishvili e seus aliados entendem que muitos georgianos desejam afastar a sombra da Rússia sobre seu país, onde o medo de uma nova dominação imperialista tem raízes profundas. A busca por um sistema democrático não se trata apenas de um desejo por liberdade; é uma defesa contra a tirania.
A Desintegração da Democracia
Ao longo de seus 12 anos de governo, o Georgian Dream conseguiu um controle metódico sobre instituições estatais, substituindo figuras chave no governo e na justiça por leais partidários. Este controle estatal é uma ferramenta vital, já que um terço da população é dependente do governo para empregos ou benefícios.
Embora a pressão da oposição tenha aumentado, a postura da UE, que concedeu recente status de candidato à Geórgia, pode ter encorajado as tendências autocráticas do partido. O governo georgiano introduziu uma lei de agentes estrangeiros similar à legislação russa, mas o forte descontentamento popular forçou uma retirada momentânea dessa proposta.
A Esperança de um Futuro Melhor
Diante da repressão, os EUA impuseram sanções a alguns oficiais do governo, mas há um ceticismo crescente sobre o impacto real dessas medidas. Falta um consenso na UE sobre como lidar com a crise georgiana, o que aumenta a incerteza sobre o futuro político do país.
O apelo por líderes autênticos se torna mais forte. A presidente Salome Zurabishvili, que foi uma das vozes de resistência contra a manipulação eleitoral, tenta unir a oposição. Contudo, a fragmentação entre partidos e a escassa presença de líderes eficazes dificultam uma formação coesa.
No entanto, o desejo do povo por um futuro alicerçado em princípios democráticos continua forte. Os protestos em Tbilisi demonstram que, apesar das adversidades, muitos georgianos ainda acreditam na possibilidade de mudança. Para que o sonho europeu não se transforme em uma miragem, é essencial que a comunidade internacional mantenha-se atenta.
Caminhos para a Mudança
Por fim, a luta pela democracia na Geórgia é uma tarefa que recai sobre os próprios georgianos. As divisões entre partidos de oposição, as mágoas do passado e a influência de figuras autoritárias criam um cenário desafiador. No entanto, a resiliência do povo georgiano tem mostrado que, mesmo nas piores situações, há um desejo inato de liberdade e justiça.
Os próximos meses serão cruciais para determinar se a Geórgia poderá reencontrar seu caminho em direção à democracia. A janela de oportunidade está se estreitando, e o clamor por um futuro diferente nunca foi tão necessário. Que o espírito de luta e a esperança prevaleçam entre aqueles que desejam um amanhã melhor para a Geórgia. Se você também acredita na luta pela liberdade e pelos direitos humanos, compartilhe suas opiniões sobre como podemos apoiar esse movimento fundamental.