O Novo Rumo da Pecuária na Amazônia: A Iniciativa de Roque Quagliato
Décadas de criação de gado na Amazônia trouxeram riquezas e desafios para Roque Quagliato, conhecido como o "Rei do Gado". Sua história é marcada por controvérsias: fazendas da sua família foram acusadas de submeter trabalhadores a condições análogas à escravidão e de desmatar grandes áreas da floresta tropical. No entanto, aos 85 anos, Quagliato se torna uma figura central em um esforço para reverter os danos causados pela pecuária na Amazônia.
A Evolução da Pecuária Brasileira
A indústria da carne bovina no Brasil está passando por uma transformação significativa, impulsionada por exigências dos principais mercados de exportação. Hoje, Quagliato é um símbolo desses novos tempos, defendendo uma pecuária mais sustentável em uma região que historicamente contribuiu para o desmatamento.
Rastreabilidade Fruto de Inovação
O gado de Quagliato foi pioneiro em ser identificado com chips implantados nas orelhas, uma parte crucial de um programa do governo do Pará. Este programa busca tornar milhões de cabeças de gado rastreáveis até janeiro do próximo ano, alinhando-se à Cúpula Climática da ONU, a COP30, que ocorrerá em Belém.
Quagliato, em uma recente entrevista, destacou suas expectativas: “Esperamos que, ao final de tudo isso, o mercado internacional reconheça e pague melhor pelo nosso produto.” Ele enfatizou que hoje em dia, “desmatadores se tornaram alvos de ações judiciais”.
O Mercado em Mudança
O foco de Quagliato está em países que exigem altos padrões de qualidade, como os Estados Unidos, a Europa e a Ásia. Muitos desses mercados atualmente optam por não comprar carne do Pará, devido a preocupações sobre saúde animal e desmatamento.
"Estamos trabalhando para abrir portas em mercados exigentes, como Japão e Coreia do Sul", disse Renan Araújo, analista da S&P Global. O objetivo é contar com um sistema de rastreabilidade que atenda a essas exigências.
O Desafio da Implementação
O Pará possui um rebanho de 26 milhões de cabeças, semelhante ao da Austrália. A meta é identificar todo o gado até 2027, mas o progresso até agora tem sido lento. Em um cenário que demanda mudanças rápidas, apenas cerca de 12 mil animais haviam sido identificados até maio deste ano.
Apesar disso, a adesão de grandes nomes da pecuária, como Quagliato, ajuda a trazer confiança a esse processo. Andy Jarvis, do Bezos Earth Fund, que financiou o projeto, acredita que a implementação bem-sucedida depende do apoio dos agricultores.
Uma Oportunidade de Mudança
Caso a iniciativa seja bem-sucedida, pode representar um marco na luta pela preservação da maior floresta tropical do mundo. Ambientalistas há muito tempo defendem que a rastreabilidade do gado é uma ferramenta poderosa para impedir que a carne proveniente de áreas desmatadas ilegalmente entre nas cadeias de suprimentos globais.
Embora não seja uma solução definitiva para o desmatamento, este avanço estava além do imaginável há alguns anos. Contudo, muitos pecuaristas ainda apresentam resistência à proposta, temendo que a regulamentação os deixe fora do mercado. A postura de Quagliato ressalta que a hora de agir é agora: “A identificação tem um custo, mas é necessário para o futuro”.
As Controvérsias Persistem
A família Quagliato enfrenta contínuas questões sobre o impacto de suas operações sobre as florestas e comunidades locais. O Ibama revelou que, embora todas as multas por desmatamento tenham sido pagas, uma delas foi resolvida através de um acordo de regeneração da floresta. Um dos membros da família, além disso, foi condenado por práticas laborais análogas à escravidão, embora esteja recorrendo da decisão.
A Importância da Rastreabilidade
A identificação de cada animal não serve apenas para garantir que o gado não provenha de áreas desmatadas. Isso também se torna um recurso crucial para o monitoramento da saúde animal. Dados apontam que rebanhos rastreáveis tendem a ser mais valorizados. O preço médio da carne bovina do Brasil gira em torno de 8% a menos que o do Uruguai, que implementa a rastreabilidade individual.
Como observou um grande pecuarista entrevistado, essa mudança é inevitável: “Estamos todos cientes de que a rastreabilidade é a direção para a qual o mercado está indo, mas o tempo para adaptação é uma preocupação”.
Quagliato não revelou números exatos do seu rebanho. Estima-se que ele possua cerca de 150 mil cabeças de gado. Pecuaristas têm hesitado em cumprir a nova legislação, em grande parte temendo consequências legais.
Apoio e Desafios
O programa de rastreabilidade encontrou apoio entre frigoríficos e ambientalistas. A JBS, maior produtora de carne do mundo, já forneceu 300 mil identificações para o programa.
Marina Guyot, do Imaflora, expressou otimismo em relação ao futuro da iniciativa, enfatizando que há vontade política para a mudança, um fator crítico para o êxito do projeto.
A Voz dos Pequenos Produtores
No coração do Pará, pequenos produtores como Alaion Lacerda, com seu rebanho de 50 cabeças de gado, enfrentam dilemas. Ele cultiva cacau sob árvores nativas que plantou, mas sua preocupação com as novas regras é evidente. “Aqui quase todo mundo tem passivo. Isso é assustador”, comenta.
Os dados de satélite monitoram o desmatamento, mas o novo sistema de rastreamento apresenta suas limitações. Pode não ser suficiente para garantir que todo gado criado em áreas desmatadas ilegalmente seja identificado corretamente.
Os desafios para convencer produtores a se adaptarem às novas regras são consideráveis. Muitos deles estão preocupados que a rastreabilidade possa impactar suas vendas, especialmente quando seus rebanhos se misturam com gado de áreas problemáticas.
O cenário atual da pecuária na Amazônia traz à tona a complexidade do equilíbrio entre desenvolvimento econômico e sustentabilidade. À medida que iniciativas como a de Quagliato avançam, torna-se crucial refletir sobre o papel de cada um na proteção da floresta e como mudanças conscientes podem beneficiar tanto os produtores quanto o meio ambiente.
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