O Futuro da Síria e o Legado das Revoltas Árabe
O colapso do regime de Bashar al-Assad na Síria não apenas desmantelou a ilusão de que a estabilidade no Oriente Médio poderia ser mantida por meio da brutalidade, mas também lançou luz sobre as falhas estruturais que afetam a região. O governo sírio, conhecido por sua repressão extrema, não conseguiu garantir controle duradouro, mesmo com o apoio de aliados poderosos como Irã e Rússia. Mais crucialmente, o próprio exército sírio, mal alimentado e mal pago, perdeu a vontade de proteger o regime. Quando o grupo rebelde Hayat Tahrir al-Sham chegou a Damasco, a queda da capital ocorreu praticamente sem resistência.
O Despertar do Povo Árabe
A queda de Assad desafia a narrativa persistente de que a Primavera Árabe foi um mero devaneio. As mobilizações que começaram em 2010 e se espalharam pelo mundo árabe, embora inicialmente suprimidas, não foram em vão. A história mostrou que a resistência popular não desapareceu; pelo contrário, ela continua viva e pulsante. O que se observa agora é que, a menos que os líderes árabes abordem de forma séria os problemas regionais, as ondas de protesto e insatisfação nunca cessarão. A verdadeira reforma se faz necessária e, sem isso, os líderes da região, assim como fez Assad, descobrirão que a repressão eficaz se esgota frente a um povo insatisfeito.
Desafios no Mundo Árabe
Atualmente, muitos países árabes enfrentam desordem e descontentamento, mesmo aqueles tradicionalmente vistos como bastiões de estabilidade, como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos. Embora tenham oferecido generosos pacotes de ajuda a seus vizinhos, o foco melancólico se volta agora para a economia interna Saudita. O que isso significa? O apoio à causa palestina pode estar em risco, enquanto esforços para normalizar relações com Israel ganham força.
Um exemplo é a Arábia Saudita, que na tentativa de enfrentar os efeitos das revoltas, lançou um pacote de bem-estar social que superou 130 bilhões de dólares, com promessas de aumento salarial e novos empregos. O príncipe herdeiro Mohammed bin Salman investe em reformas sociais, que atraem a juventude frustrada com as rígidas normas sociais. Contudo, a verdadeira questão permanece: como resolver a elevada taxa de desemprego juvenil, que gira em torno de 16%?
Os desafios que enfrentam os países do Golfo são apagados diante das crises mais profundas de outras nações, como Egito, Jordânia e Tunísia, que têm dificuldade em se desassociar da dependência de ajuda externa e remessas. Enquanto isso, nação após nação, como Líbano, Líbia, Sudão e Iémen, deslizam para estados falidos, onde a corrupção generalizada e a instabilidade se tornaram a norma.
O Ciclo Vicioso da Repressão
Um elemento comum a todos esses países é a resistência em abrir seus sistemas políticos. A falta de governança eficaz e da capacidade de adequar a economia às necessidades da população perpetuaram as tensões que culminaram nas revoltas da Primavera Árabe. As mobilizações entre 2010 e 2012 não apenas questionaram modelos de governança desatualizados, mas também revelaram a fragilidade das instituições que lhe davam suporte.
Após os levantes, muitos líderes conseguiram permanecer em seus postos, fechando os olhos para as demandas populares. Quando novos protestos eclodiram em 2019 em nações como Argélia, Iraque e Sudão, a resposta brutal dos governantes apenas reforçou a ideia de que os antigos problemas não foram resolvidos. O que se observa é que o descontentamento do povo árabe não desapareceu, e os líderes que ignoram suas demandas correm o risco de se deparar com crises semelhantes às que Assad enfrentou.
Um Novo Caminho para a Síria
Com o fim do regime de Assad, parece haver uma oportunidade única para a Síria. Os novos líderes precisam reconhecer que a governança baseada na opressão apenas perpetuará a insatisfação. Em vez de replicar as falhas do passado, eles têm a chance de seguir um caminho democrático, rica em inclusão e diversidade. Para se assegurar um futuro estável, é primordial que eles considerem as vozes de todos os grupos sociais — incluindo minorias étnicas e religiosas — evitando assim o mesmo destino de líderes como Mohamed Morsi no Egito.
Caminhos Possíveis
- Inclusão das Minorias: Adotar políticas que integrem as diversas etnias e religiões na estrutura governamental poderá criar um ambiente estável.
- Respeito à Diversidade: A promoção da igualdade de gênero e do respeito por diferentes culturas e religiões deve estar no centro da nova governança.
- Reformas Econômicas: É essencial trabalhar para um sistema econômico que promova oportunidades baseadas no mérito, e não em relações pessoais.
A implementação dessas estratégias poderá não apenas transformar a Síria, mas também estimular mudanças em toda a região. O reconhecimento de que a exclusão levará a um novo ciclo de revolta é um passo fundamental para garantir um futuro melhor.
Reflexões Finais
A queda de Assad é um lembrete vívido de que a repressão nunca é uma solução sustentável. O que ocorreu na Síria pode muito bem se repetir em outras regiões que ignoram a vontade de seu povo. A verdadeira questão é se os novos líderes sírios estarão dispostos a aprender com os erros do passado e buscar um caminho pluralista, ou se seguirão a via da opressão.
Por fim, o futuro da Síria pode ser um pivô não apenas para o país, mas para o Oriente Médio. A luta pela inclusão, dignidade e respeito às diversidades sociais, étnicas e religiosas pode finalmente criar as bases para uma democracia que represente a verdadeira vontade do povo. Se a história nos ensinou algo, é que os líderes que ignoram o clamor de sua população fazem isso por sua conta e risco. E a variável mais importante no equacionamento do sucesso será a disposição em ouvir e agir. Agora, é a hora de se perguntar: será que a Síria está pronta para romper com o ciclo de opressão e descontentamento?